quinta-feira, 17 de maio de 2012

Código Florestal aprovado ameaça produção de açaí na Amazônia



por Jorge Dantas de Oliveira

O projeto de lei para reforma do Código Florestal aprovado pelo Congresso ameaça as áreas úmidas de todo o Brasil, como várzeas e manguezais, responsáveis por serviços e produtos ambientais amplamente consumidos e valorizados pela população brasileira, como o açaí.

O pequeno fruto de cor púrpura, típico da floresta tropical e símbolo da cultura ribeirinha, é hoje o maior produto extrativista não-madeireiro do Brasil. Em 2009, foram 115 mil toneladas colhidas e R$ 160,5 milhões gerados. O Pará concentra 87,4% da produção nacional, seguido pelo Amapá, Amazonas e Maranhão.

Dos frutos do açaizeiro, 90% vêm de áreas inundáveis às margens dos rios, manejadas ou não. Regiões como essas são conhecidas como Áreas de Preservação Permanente (APPs), e estão gravemente ameaçadas pelo projeto que se encontra sobre a mesa da presidente Dilma Rousseff. Ele ameaça a integridade ecológica, diminui os limites físicos e fragiliza essas áreas, abrindo brechas para "oficializar" um prejuízo ambiental sem precedentes na história do país. Por isso, a única alternativa viável para se evitar tal retrocesso é o veto total.

Segundo especialistas, a extração do açaí ainda tem dados subdimensionados, principalmente por ser uma atividade desempenhada nos rincões da Amazônia, onde a coleta e o registro das informações são caros e difíceis.

Combate aos radicais livres

De acordo com o biólogo e geneticista do Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (Inpa), Charles Clement, o açaí é fonte de energia eficiente e natural. “Seu óleo é pura energia. Nosso fígado degrada o óleo para criar o açúcar que é queimado no corpo quando realizamos atividades físicas”, afirmou. Por isso, declarou Charles, o açaí faz sucesso entre atletas e em academias de todo o país.

Outros estudos dão conta de que o açaí é rico em flavonóides e antocianinas, substâncias úteis para o funcionamento do corpo humano. Entre outras coisas, o fruto ajuda no combate aos radicais livres, facilita o trânsito intestinal, favorece a circulação sanguínea e previne doenças cardíacas, além de retardar a degeneração natural das células. Ou seja, ele retarda o envelhecimento.

Segundo um dos maiores estudiosos da agropecuária amazônica, o engenheiro agrônomo da Embrapa da Amazônia Oriental, Alfredo Homma, hoje existem cerca de 80 mil hectares de açaizeiros somente no Pará, onde trabalham 20 mil famílias. Agosto, setembro e outubro são os meses de colheita.

O estudioso disse que, dos 20 municípios que mais produzem açaí no Brasil, 17 ficam no Pará, com destaque para Igarapé-Miri, a 200 quilômetros de Belém. A cidade de pouco mais de 58 mil habitantes é considerada o “município-símbolo” das transformações econômicas e sociais que o açaí tem causado na porção paraense do Rio Amazonas, por conta da melhoria no padrão de vida de muitos produtores e extrativistas.

Em potes de iogurte

Homma, da Embrapa, explicou que o volume de açaí não é tão grande comparado a outros produtos que o Pará produz, mas sua rápida valorização econômica chama a atenção de qualquer um. Por volta de 1996, o litro de açaí grosso era vendido a R$ 1,50 nos arredores de Belém. Hoje, está em R$ 24. “Foi um aumento de 1600% no preço, variação ocorrida em cerca de quinze anos. Nenhuma outra fruta agrícola cresceu tanto assim em valor no estado”, constatou.

O açaí paraense é voltado, sobretudo, para o mercado interno. Cerca de sete em cada dez quilos da produção seguem para o Sudeste, em especial São Paulo e Belo Horizonte. O resto vai para o exterior, onde os maiores compradores são Estados Unidos, França e Japão. Na terra do sol nascente, o fruto é vendido em supermercados dentro de um pequeno recipiente, similar a um pote de iogurte. A Embrapa da Amazônia Oriental estima que, em 2009, as exportações de açaí tenham sido de U$ 26 milhões. Em 2002, quatro anos antes, eram de “apenas” U$ 1 milhão.

As áreas úmidas, como as várzeas amazônicas produtoras de açaí, são áreas de preservação permanente por serem mais sensíveis do ponto de vista ambiental e fundamentais para a conservação dos recursos hídricos, da biodiversidade e para o aumento dos índices de produtividade.

Nesta categoria estão não só as matas ciliares nas margens de rios, várzeas, alagados e manguezais, mas também os topos de morros e montanhas, encostas, nascentes e declives. Esses locais são importantes para a manutenção de uma série de serviços ambientais, como a produção de água, a proteção do solo contra a erosão e a estabilidade ecológica.

Integridade em risco

Esse é mais um dos motivos para o projeto de reforma do Código Florestal aprovado no Congresso ser vetado integralmente, pois vetos parciais não conseguiriam reverter as ameaças a essas áreas. As APPs e o açaí da Amazônia estão sob forte ameaça, pois o projeto aprovado que está sobre a mesa da presidente Dilma Rousseff traz uma série de flexibilizações à proteção dessas regiões.

O projeto aprovado concede ampla anistia para as ocupações irregulares das áreas de preservação permanente ocupadas até julho de 2008, e prevê anistia para as multas aplicadas aos desmatadores dessas áreas. Hoje, a maior parte das multas por crimes ambientais é aplicada na Amazônia, nos estados do Mato Grosso, Pará, Rondônia e Amazonas.

Caso o projeto seja sancionado pela presidente Dilma Rousseff, mesmo que parcialmente (veto parcial), as faixas de proteção dos rios passam a ser medidas não pelo leitor maior durante as cheias, mais sim pelo leito regular do curso d’água. Outros dispositivos prevêem, sob certas condições, a ocupação de topo de morros, montes e serras, e o projeto também deixa de considerar várzeas, veredas e manguezais como APPs, fragilizando uma série de ecossistemas por todo o país.
Fonte:http://www.wwf.org.br/informacoes/noticias_meio_ambiente_e_natureza/?31323

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