sexta-feira, 28 de junho de 2013

Biofortificação de alimentos e a monocultura da mente

Enfrentando a “monocultura da mente” – Bilionários renunciam a cultivos ricos em ferro para dar lugar às bananas GM na Índia
Vandana Shiva
Tradução: Bruno Prado
A natureza nos deu uma cornucópia de biodiversidade rica em nutrientes. A má nutrição e a deficiência em nutrientes resultam, por sua vez, da destruição da biodiversidade. A Revolução Verde disseminou monoculturas químicas de arroz e trigo, excluindo a biodiversidade de nossas plantações e dietas. E aquilo que sobreviveu como culturas espontâneas – como as folhas de amaranto (chaulai) e o chenopodium (bathua), ambos ricos em ferro – foi pulverizado com venenos e herbicidas. Ao invés de cuidá-los e protegê-los como dádivas ricas em ferro e vitaminas, esses vegetais foram tratados como “pragas”.
Foto: http://seedfreedom.in

A “monocultura da mente” trata a diversidade como doença e cria estruturas coercivas para remodelar esse nosso mundo biológica e culturalmente diverso a partir dos conceitos de uma classe privilegiada, uma raça e um gênero de uma única espécie. Quando a “monocultura da mente” tomou o controle, a biodiversidade desapareceu de nossas plantações e de nossos alimentos. É a destruição de dietas e cultivos ricos em biodiversidade que nos levou à atual crise da má nutrição.
A mais recente loucura da engenharia genética é empurrar bananas geneticamente modificadas para a Índia de modo a reduzir a deficiência de ferro das mulheres indianas. Setenta e cinco por cento das mulheres indianas sofrem de deficiência de ferro.
Um homem rico cujo nome é Bill Gates está financiando um cientista australiano, James Dale, que conhece uma espécie, a banana, para impor bananas transgênicas ineficientes e perigosas a milhões de pessoas na Índia e em Uganda.
O projeto é um desperdício de dinheiro e um desperdício de tempo. Levará dez anos e milhões de dólares para que a pesquisa seja terminada. Enquanto isso, governos, agências de pesquisa e cientistas não conseguirão enxergar alternativas democráticas, testadas pelo tempo, seguras, de baixo custo e baseadas na biodiversidade, que estão nas mãos das mulheres.
As mulheres indianas têm uma riqueza de conhecimento sobre biodiversidade e nutrição recebida por diversas gerações de suas mães e avós. Qualquer mulher pode lhe dizer que a solução para a má nutrição está em cultivar a nutrição que, por sua vez, significa cultivar a biodiversidade.
Para remover a deficiência de ferro, plantas ricas em ferro deveriam ser cultivadas em todos os lugares – fazendas, hortas domésticas, hortas comunitárias, hortas escolares. A deficiência de ferro não foi criada pela natureza e podemos nos livrar dela nos tornando cocriadores e coprodutores junto à natureza.
Mas há um “mito da criação” que é cego a ambas – à criatividade e biodiversidade da natureza assim como à criatividade, inteligência e conhecimento das mulheres. De acordo com esse “mito da criação” do capitalismo patriarcal, homens ricos e poderosos são os “criadores”. Eles podem ser proprietários da vida através de patentes e propriedade intelectual. Eles podem jogar com a evolução milenar e complexa da natureza e reivindicar que seus atos de manipulação genética – triviais, contudo destrutivos – estão “criando” a vida, os alimentos e a nutrição.
A biodiversidade nativa da Índia oferece ricas fontes de ferro. Por exemplo, o amaranto tem 11 mg de ferro em 100 gramas do alimento, o trigo sarraceno ou trigo-mourisco tem 15.5, as folhas de amaranto tem até 38.5, a karonda (Carissa carandas), 39.1, e o caule de lótus, 60.6.
As bananas têm somente 0.44 mg de ferro por 100 gramas de porção comestível. Todo o esforço em aumentar o ferro no conteúdo das bananas será menor que o ferro no conteúdo de nossa biodiversidade local.
Não apenas a banana GM não é a melhor opção para prover nossa dieta com ferro, ela irá ameaçar ainda mais a biodiversidade de bananas e cultivos ricos em ferro além de introduzir novos riscos ecológicos.
Se adotada, a banana GM será cultivada em grandes monoculturas, tal como o algodão Bt, nas plantações de banana da América Central. O governo e outras agências empurrarão a falsa solução e nossa biodiversidade de alimentos ricos em ferro irá desaparecer.
Além disso, nossas variedades de banana nativas serão deslocadas e contaminadas. Estas incluem Nedunendran, Zanzibar, Chengalikodan e a variedade Manjeri Nendran II.
A ideia de uma “agricultura de nutrientes” composta por uns poucos nutrientes em monoculturas de uns poucos cultivos já está sendo empurrada no nível das políticas. O ministro das finanças indiano P. Chidambaram anunciou um projeto de 36 milhões de dólares para as “nutrifazendas” em seu discurso do orçamento de 2013.  Os seres humanos precisam de biodiversidade de nutrientes, incluindo a escala completa de micronutrientes e oligoelementos. Estes vêm dos solos saudáveis e da biodiversidade.
Há um impulso perverso entre a brigada da biotecnologia para que se declare uma guerra contra a biodiversidade em seu centro de origem. Foi feita uma tentativa de introduzir a berinjela Bt na Índia, que é o centro da diversidade das berinjelas. O milho GM está sendo introduzido no México, o centro de origem do milho. A banana GM está sendo introduzida nos dois países onde a banana é um cultivo significativo e tem grande diversidade. Um é a Índia e outro é a Uganda, o único país onde a banana é um alimento básico das dietas.
HarvestPlus é a aliança corporativa que está empurrando a “biofortificação” – o cruzamento de plantas para aumentar seu valor nutricional. Mas especialistas afirmam que a fortificação de nutrientes nos alimentos pode levar a problemas insuperáveis: “(ela) pode fornecer quantidades tóxicas de nutrientes para um indivíduo e também causar efeitos colaterais associados, além das chances potenciais de que os produtos fortificados ainda não serão uma solução para deficiências de nutrientes entre as populações de baixa renda, que podem não ter os meios para adquirir o novo produto, além das crianças, que podem vir a não consumir quantidades adequadas deste”.
Os cientistas australianos estão usando um vírus que infecta a banana como promotor gênico [usado na construção de um evento transgênico]. Este pode se espalhar através da transferência genética horizontal. Toda engenharia genética usa genes de bactérias e vírus. Estudos independentes mostraram que há riscos para a saúde associados com os alimentos GM.
Não há necessidade de introduzir uma tecnologia perigosa num alimento pobre em ferro como a banana quando temos tantas opções acessíveis, seguras e diversas que correspondem às nossas necessidades de ferro.
Temos de cultivar a nutrição aumentando a biodiversidade, não ‘fortificando’ industrialmente alimentos nutricionalmente vazios de alto custo ou colocando um ou dois nutrientes em cultivos geneticamente modificados.

Não precisamos desses experimentos irresponsáveis que criam novas ameaças para a biodiversidade e para nossa saúde; não necessitamos de soluções de nutrientes impostas por homens poderosos sentados em lugares distantes, que são totalmente ignorantes da biodiversidade dos nossos campos e dos nossos pratos, e que não terão de aguentar as consequências de seu poder destrutivo.  Precisamos colocar a segurança alimentar nas mãos das mulheres para que a última entre elas e a última das crianças possam partilhar das dádivas de biodiversidade da natureza.

Cordel “A maldição dos Agrotóxicos ou o que faz o Agronegócio”


Veja mais na Página Pratos Limpos - Porque alimentação também é política

segunda-feira, 24 de junho de 2013

Fim das isenções fiscais para os agrotóxicos!!!!!




A Campanha Permanente Contra os Agrotóxicos tem apoio de mais de 50 entidades nacionais que se uniram desde 2011 para sensibilizar a população brasileira para os riscos que os agrotóxicos representam, e a partir daí tomar medidas para frear seu uso no Brasil.
Assine nossa Petição!
A Campanha Permanente Contra os Agrotóxicos lançou um abaixo assinado para banir do nosso país os agrotóxicos já banidos em outros países. É inaceitável que o nosso país continue sendo a grande lixeira tóxica do planeta. Por isso colabore:
Assine a petição virtual
Baixe e imprima o abaixo-assinado e papel e comece a colher assinaturas.


Dossiê ABRASCO
Alguém ainda acha que agrotóxico não faz mal? Veja nos dossiês da ABRASCO (parte 1parte 2,parte 3) a devastação que os agrotóxicos e o agronegócio vem causando à população brasileira.

sábado, 22 de junho de 2013

O preço do progresso

Enquanto perante as recentes manifestações na Turquia foi imediata a leitura sobre as "duas Turquias", no caso do Brasil foi mais difícil reconhecer a existência de "dois Brasis". Mas ela aí está aos olhos de todos. A dificuldade em reconhecê-la reside na própria natureza do "outro Brasil", um Brasil furtivo a análises simplistas.

Com a eleição da Presidente Dilma Rousseff, o Brasil quis acelerar o passo para se tornar uma potência global. Muitas das iniciativas nesse sentido vinham de trás mas tiveram um novo impulso: Conferência da ONU sobre o Meio Ambiente, Rio +20, em 2012, Campeonato do Mundo de Futebol em 2014, Jogos Olímpicos em 2016, luta por lugar permanente no Conselho de Segurança da ONU, papel ativo no crescente protagonismo das "economias emergentes", os BRICS (Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul), nomeação de José Graziano da Silva para Diretor-Geral da Organização da Nações Unidas para a Alimentação e Agricultura (FAO), em 2012, e de Roberto Azevedo para Diretor-Geral Organização Mundial de Comércio, a partir de 2013, uma política agressiva de exploração dos recursos naturais, tanto no Brasil como em África, nomeadamente em Moçambique, favorecimento da grande agricultura industrial sobretudo para a produção de soja, agro-combustíveis e a criação de gado. 


Beneficiando-se de uma boa imagem pública internacional granjeada pelo Presidente Lula e as suas políticas de inclusão social, este Brasil desenvolvimentista impôs-se ao mundo como uma potência de tipo novo, benévola e inclusiva. Não podia, pois, ser maior a surpresa internacional perante as manifestações que na última semana levaram para a rua centenas de milhares de pessoas nas principais cidades do país. Enquanto perante as recentes manifestações na Turquia foi imediata a leitura sobre as "duas Turquias", no caso do Brasil foi mais difícil reconhecer a existência de "dois Brasis". Mas ela aí está aos olhos de todos. A dificuldade em reconhecê-la reside na própria natureza do "outro Brasil", um Brasil furtivo a análises simplistas. Esse Brasil é feito de três narrativas e temporalidades. 



A primeira é a narrativa da exclusão social (um dos países mais desiguais do mundo), das oligarquias latifundiárias, do caciquismo violento, de elites politicas restritas e racistas, uma narrativa que remonta à colónia e se tem reproduzido sobre formas sempre mutantes até hoje. A segunda narrativa é a da reivindicação da democracia participativa que remonta aos últimos 25 anos e teve os seus pontos mais altos no processo constituinte que conduziu à Constituição de 1988, nos orçamentos participativos sobre políticas urbanas em centenas de municípios, no impeachment do Presidente Collor de Mello em 1992, na criação de conselhos de cidadãos nas principais áreas de políticas públicas especialmente na saúde e educação aos diferentes níveis da ação estatal (municipal, estadual e federal). 



A terceira narrativa tem apenas dez anos de idade e diz respeito às vastas políticas de inclusão social adotadas pelo Presidente Lula da Silva a partir de 2003 e que levaram a uma significativa redução da pobreza, à criação de uma classe média com elevado pendor consumista, ao reconhecimento da discriminação racial contra a população afrodescendente e indígena e às políticas de ação afirmativa e à ampliação do reconhecimento de territórios e quilombolas e indígenas.



O que aconteceu desde que a Presidente Dilma assumiu funções foi a desaceleração ou mesmo estancamento das duas últimas narrativas. E como em política não há vazio, o espaço que elas foram deixando de baldio foi sendo aproveitado pela primeira e mais antiga narrativa que ganhou novo vigor sob as novas roupagens do desenvolvimento capitalista todo o custo, e as novas (e velhas) formas de corrupção. As formas de democracia participativa foram cooptadas, neutralizadas no domínio das grandes infraestruturas e megaprojetos e deixaram de motivar as gerações mais novas, orfãs de vida familiar e comunitária integradora, deslumbradas pelo novo consumismo ou obcecadas pelo desejo dele. 



As políticas de inclusão social esgotaram-se e deixaram de corresponder às expectativas de quem se sentia merecedor de mais e melhor. A qualidade de vida urbana piorou em nome dos eventos de prestígio internacional que absorveram os investimentos que deviam melhorar transportes, educação e serviços públicos em geral . O racismo mostrou a sua persistência no tecido social e nas forças policiais. Aumentou o assassinato de líderes indígenas e camponeses, demonizados pelo poder político como "obstáculos ao desenvolvimento" apenas por lutarem pelas suas terras e modos de vida, contra o agronegócio e os megaprojetos de mineração e hidrelétricos (como a barragem de Belo Monte, destinada a fornecer energia barata à indústria extrativa).



A Presidente Dilma foi o termómetro desta mudança insidiosa. Assumiu uma atitude de indisfarçável hostilidade aos movimentos sociais e aos povos indígenas, uma mudança drástica em relação ao seu antecessor. Lutou contra a corrupção mas deixou para os parceiros políticos mais conservadores as agendas que considerou menos importantes. Foi assim que a Comissão de Direitos Humanos, historicamente comprometida com os direitos das minorias, foi entregue a um pastor evangélico homofóbico e promove uma proposta legislativa conhecida como “cura gay”. As manifestações revelam que, longe de ter sido o país que acordou, foi a Presidente quem acordou. 



Com os olhos postos na experiência internacional e também nas eleições presidenciais de 2014, a Presidente Dilma tornou claro que as respostas repressivas só agudizam os conflitos e isolam os governos. No mesmo sentido, os presidentes de câmara de nove cidades capitais já decidiram baixar o preço dos transportes. É apenas um começo. Para ele ser consistente é necessário que as duas narrativas (democracia participativa e inclusão social intercultural) retomem o dinamismo que já tiveram. Se assim for, o Brasil estará a mostrar ao mundo que só merece a pena pagar o preço do progresso, aprofundando a democracia, redistribuindo a riqueza criada e reconhecendo a diferença cultural e política daqueles para quem progresso sem dignidade é retrocesso.


Boaventura de Sousa Santos é sociólogo e professor catedrático da Faculdade de Economia da Universidade de Coimbra (Portugal).

quinta-feira, 20 de junho de 2013

Chomsky: “Estou com os manifestantes do Brasil” #vemprarua #benscomuns #participaçãopopularnagestãodosbenscomuns #Occuppy

Avram Noam Chomsky. Foto: Camila Nobrega

Camila Nobrega

Do Canal Ibase
Enviada a Bonn (Alemanha)
Cercado de jornalistas e curiosos de pelo menos 30 países, na noite desta segunda-feira (17/6), o linguista e crítico político de renome mundial Avram Noam Chomsky, de 84 anos, caminhava lentamente para se retirar da plenária após sua palestra no Forum Global de Midia, em Bonn (Alemanha). Estava acompanhado de seguranças e assessores que tentavam manter todos afastados e não parecia disposto a responder mais indagações. Em uma fileira formada ao lado dele, consegui gritar uma pergunta. Ao ouvir as palavras “Turquia” e “Brasil”, Chomsky virou-se para mim, respondendo-a:
- Embora sejam protestos diferentes e com suas peculiaridades, as manifestações nos dois países são tentativas de o povo recuperar a participação nas decisões. É uma forma de ir contra o domínio dos interesses de grupos econômicos. Acho ambos muito importantes e posso dizer que estou com os manifestantes – disse o linguista, entusiasta do movimento “Occuppy”, declarando apoio ao movimento que toma as ruas de cidades brasileiras e também aos manifestantes turcos.
Ele tem razão ao tentar separar os dois movimentos. Embora semelhanças pareçam gritar neste momento, devido ao cunho popular de ambos os protestos, são países de contextos socioeconômicos e culturais muito diferentes. Qualquer tentativa de relacioná-los pode ser leviana, se não forem tomadas as devidas ressalvas.
Mas, há, no entanto, uma característica que une brasileiros e turcos neste momento: a tentativa de recuperar diferentes formas de liberdade e mostrar que a sociedade civil está acordada. Durante seu discurso para cerca de duas mil pessoas, entre jornalistas, autoridades europeias e pesquisadores do mundo inteiro reunidos para o fórum que ocorre até esta quarta-feira, na pequena cidade de Bonn, Chomsky afirmou que a ocupação da praça Taksim é um microcosmo da defesa dos bens comuns.
- Trata-se de um movimento global contra a violência que ameaça a liberdade em diferentes países. As pessoas estão indo as ruas para defender bens comuns, aqueles que são compartilhados dentro das sociedades. O capitalismo baseado na massificação de privatizações não compreende a gestão coletiva, aí esta o problema. Os movimentos que ocorrem neste momento são legítimos, na tentativa de recuperar a participação popular na gestão destes bens.
Para além da dominação econômica
Chomsky discursa para mais de duas mil pessoas. Foto: Camila Nobrega
O discurso de Chomsky esteve centrado principalmente em uma crítica às estratégias de desenvolvimento norte-americanas e ao poder das grandes corporações multinacionais atualmente. Para o pensador, as privatizações de recursos básicos, alicerces dos regimes neoliberais, alteram a relação dos cidadãos com o mundo a sua volta e reduzem também a noção de bens comuns.
- Para muitas sociedades, a propriedade privada se tornou aparentemente a única possibilidade de divisão de territórios e recursos. Isso está acabando com essa noção do que é comum – disse, ampliando a análise para a participação social: – Existe um pensamento muito difundido em sistemas políticos e econômicos pautados em ideais liberais que defende a manutenção do poder de decisão nas mãos de poucas pessoas, que seriam o grupo mais “bem preparado” da sociedade. Os demais seriam apenas espectadores. É contra isso que alguns grupos estão lutando.
A base desse pensamento parte de um dado bastante claro que Chomsky trouxe à tona: segundo ele, 70% da população norte-americana, por exemplo, não tem qualquer influência sobre a política nacional. Ou seja, a maioria da população não tem poder, por exemplo, sobre políticas públicas que afetam suas vidas diariamente.
Autor de mais de 70 livros e considerado um dos principais intelectuais vivos atualmente (a quantidade de vezes que ele aparece em citações bibliográficas nos dias de hoje se assemelha a de grandes filósofos, como Platão), Noam Chomsky é, na verdade, um grande defensor da capacidade humana de criar e de se libertar de estruturas de dominação. Seus pensamentos vieram a público no início da década de 1960, quando ele fez uma crítica aberta a outros linguistas, atacando a noção de behaviorismo, segundo a qual o ser humano aprende apenas por imitação. Chomsky defendia, já àquela época, a existência de uma capacidade inata do ser humano de se expressar, de diferentes formas.
Ao longo dos anos, ele foi adaptando este pensamento a um contexto político e se tornou um dos mais vorazes críticos do sistema politico-econômico e também cultural dos Estados Unidos. Nascido na Filadélfia, ele se tornou uma voz dissonante dentro do território norte-americano.
Frente a uma plateia composta de pessoas vindas de todo o mundo para a conferência em Bonn, mas majoritariamente de europeus, o discurso de Chomsky pareceu soar um pouco anacrônico. Foi o que se ouviu nos corredores. Não foi essa a interpretação, porém, de participantes vindos de países africanos em desenvolvimento. Não houve também anacronismo para os representantes turcos que estão por aqui, ou de outras pessoas vindas da região que vive hoje a Primavera Árabe. Para estes grupos, nos quais o Brasil parece se incluir, uma fala de Chomsky ecoou:
- O termo democracia pode parecer óbvio para alguns, e aí está a ameaça. Há vários tipos de democracia, várias formas de aplicação deste conceito. O que podemos pensar é: este tipo de democracia onde a esmagadora maioria da população não tem participação alguma é a que queremos?
Não é preciso muito mais para explicar o porquê de os representantes brasileiros, após o discurso de Chomsky, terem se sentado à mesa com turcos, sul-africanos e outros representantes de países cujos projetos de democracia e desenvolvimento estão sendo contestados neste momento. Observando de outro continente as manifestações que estão parando cidades brasileiras nos últimos dias, o discurso do linguista não parece nem um pouco anacrônico.
Enviado por CIMI


quarta-feira, 19 de junho de 2013

Brasil cultivará soja de Monsanto para China!!!!




Esta aprobación es crucial para nuestra empresa y para los agricultores brasileños", comentó Brett Begemann, presidente de Monsanto. Actualmente, en el programa 'Ground Breakers' de la empresa participan unos 1.000 agricultores dispuestos a cultivar semillas de soja transgénica de Monsanto en Brasil

China es el mayor importador de soja brasileña, y Brasil es el segundo mayor productor mundial de soja después de EE.UU.  

La variedad de soja resistente a plagas y herbicidas que ha aprobado China, llamada Intacta RR2 PRO, fue creada por Monsanto específicamente para el mercado internacional.  

Monsanto espera que con la introducción del cultivo comercial de soja transgénica en Brasil empezará el cultivo por todo Sudamérica. En 2014 la empresa tiene planes de realizar pruebas con las semillas Intacta en Argentina antes de iniciar el cultivo comercial en este país en 2015.

Texto completo en: 
http://actualidad.rt.com/actualidad/view/97794-brasil-cultivar-soja-monsanto-china

Enviado por Sonia Mariza

Dois casos sérios em Mato Grosso (LIVROS PARA BAIXAR)

Baixe o livro e o caderno "Dois casos sérios em Mato Grosso. A soja em Lucas do Rio Verde e a cana-de-açúcar em Barra do Bugres”

Realização: Fórum Mato-grossense 
de Meio Ambiente e Desenvolvimento (FORMAD)
Textos: Sergio Schlesinger
Fotos: Caio Bruno Oliveira
Coordenação do projeto: João Inacio Wenzel

LIVRO: http://www.formad.org.br/wp-content/uploads/2013/06/LIVRO_dois_casos_serios_agrocombustiveis_FORMAD.pdf
CADERNO: http://www.formad.org.br/wp-content/uploads/2013/06/CADERNOdois_casos_serios_agrocombustiveis_FORMAD.pdf

Sobre o FORMAD:
O Fórum Mato-grossense de Meio Ambiente e Desenvolvimento (Formad) é uma rede que congrega uma diversidade de segmentos socioambientais do estado de Mato Grosso na defesa e promoção do meio ambiente. Desenvolve ações coletivas relacionadas às políticas públicas e promove debates para a
construção de alternativas de desenvolvimento.
O Formad foi fundado em 1992, tendo como objetivo defender o desenvolvimento sustentável do Mato Grosso, sob o princípio da inclusão social, democratização do acesso à terra, exploração sustentável dos recursos
naturais, conservação da biodiversidade dos biomas Pantanal, Cerrado e Amazônia e valorização da diversidade cultural.
É composto por entidades que atuam nas áreas de direitos humanos, meio ambiente, indigenismo, agricultura familiar, saúde e saberes populares, educação e direitos trabalhistas. Esta diversidade retrata a identidade do
Formad, que é a de conceber as questões ambientais e sociais de modo integrado.
A missão do Fórum contempla:
• Articular as organizações da sociedade civil com ideologias próximas para mobilizações coletivas;
• Desenvolver ações em rede;
• Monitorar as políticas públicas de modo crítico e propositivo;
• Mobilizar a sociedade civil para intervir nas questões políticas socioambientais e para transformar a realidade das populações vulneráveis;
• Ser contraponto ao modelo de desenvolvimento pautado no agronegócio, monocultura e concentração fundiária;
Destacam-se como público alvo do FORMAD a agricultura familiar, as populações tradicionais e indígenas no Mato Grosso.
Veja mais em:http://www.formad.org.br/?p=2428

#vemprarua contra os transgênicos e agrotóxicos no Brasil!!!

É uma montagem mas maravilhosa, numa das Marchas contra a Monsanto. Não tinha tanta gente assim mas quem sabe na próxima....
Nesse momento de indignação geral, considero importantíssima também a questão do agrotóxico, dos alimentos transgênnicos, do modelo agrícola agroquímico, da fome insaciável do agronegócio ameaçando Povos indígenas, camponeses, a nossa soberania alimentar,  do campo e da cidade!!!!!
 Foto de Terra Sem Transgênicos

segunda-feira, 17 de junho de 2013

Rede de Mulheres publica sistematização de experiências agroecológicas na Amazônia


Acabou de sair da gráfica a sistematização de experiências agroecológicas e solidárias da Rede de Mulheres Empreendedoras Rurais da Amazônia (RMERA). 
Foram incluídas atividades de mulheres de 9 estados: Acre, Amapá, Amazonas, Maranhão, Mato Grosso, Pará, Rondônia, Roraima e Tocantins.
"Agradecemos e dedicamos este livro a todas as mulheres agricultoras, artesãs, ribeirinhas, quilombolas, indígenas, negras, trabalhadoras autônomas da cidade, assessoras, educadoras, ao GT mulheres da ANA, a FETAGRI, ao
MMNEPA, a FASE /Programa Amazônia, que se envolveram neste rico processo. E as parcerias com HEKS e ACTIONAID que fizeram com que nosso sonho se tornasse realidade".

“Esta publicação é resultado de um rico processo de formação com mulheres que resolveram colocar seus ideais em prática.
As experiências apresentadas foram sistematizadas em encontros com trabalhadoras rurais dos nove Estados da Amazônia. Muito rico este processo, que além de trazer a história dos trabalhos coletivos em agroecologia desenvolvidos pelas mulheres, traz também suas subjetividades nas relações familiares, seu papel na sociedade, suas relações com o conhecimento e a própria atividade de sistematizar suas experiências. A Rede de Mulheres Empreendedoras Rurais da Amazônia - RMERA, com esta publicação e outras ações desenvolvidas visa contribuir com o fortalecimento, articulação e visibilidade dos empreendimentos econômicos gerenciados por mulheres e ou mistos. Boa leitura!”- Solange Aparecida de Oliveira -Secretária Executiva da RMERA.

Veja documento completo aqui em pdf: RMERA

As mulheres são como as águas, crescem quando se encontram!

domingo, 16 de junho de 2013

Território em disputa: os perigos da economia verde para comunidades QUEM ESTÁ GANHANDO?


A ECONOMIA VERDE VERSUS A ECONOMIA DAS COMUNIDADES
Uma história dos povos da mata atlântica no Sul do Brasil-Paraná
Os caiçaras, agroextrativistas, pescadores, quilombolas, povos indígenas que sabem lidar com a natureza sobrevivem na pressão do agronegócio, pecuaristas de búfalos que chegaram a 50 anos na região. Nos anos 90, a empresa Boticário comprou área de floresta de 2 mil hectares para criar uma Reserva. Depois chegou a Sociedade de Pesquisa em Vida Selvagem (SPVS), junto com a "The Nature Conservancy", uma grande ONG norte-americana. A SPVS comprou mais de 18 mil hectares e transformou em Reserva para estoque de Carbono com o apoio de 3 empresas americanas (Chevron, General Motors e American Eletric Power) de US$ 18 milhões de dólares). 
Resultado: COMUNIDADE IMPEDIDA DE ACESSO A FLORESTA E MANGUE.
Essas empresas poluem o ar e querem "estocar carbono" para compensar sua poluição, chamado projeto REED, que fazem parte da chamada ECONOMIA VERDE, alerta o Movimento Mundial pelas Florestas Tropicais . 
Para o Movimento Mundial pelas Florestas Tropicais uma das coisas mais importantes para a economia verde, para o grande capital, as grandes empresas que tem interesse é a "venda de serviços ambientais" (vender o Carbono que está nas florestas, vender a água, a biodiversidade-FAZER NEGÓCIO). Quem tem interesse? Primeiramente as Grandes empresas que vem destruindo incessantemente e as grandes Ongs preservacionistas, com a ideia de que para preservar tem que tirar as pessoas. Para o Movimento pelas florestas isso é um contra senso pois sabemos que onde ainda há florestas no mundo tem povos tradicionais usando e mantendo pois dependem das florestas para sobreviver, sabem lidar com a natureza.
Resultado: impactos na segurança alimentar (são impedidos de fazer roça, pescar), êxodo rural, medo, insegurança,  empobrecimento

Resistência:  É animador ver que as comunidades estão reagindo, se organizando para voltar a ter acesso ao território e FAZENDO AGROECOLOGIA em parceria com o MST e Via Campesina!!!!! A importância das mulheres e jovens nesse processo é grande em Rio Pequeno. 
Cuidado com o solo, cultivos orgânicos, sem agrotóxicos, diversificação de culturas, produção de abelhas nativas, adubação verde, trabalho coletivo....
Hoje a ameaça é o modelo agroquímico de monocultivos e agrotóxicos.
Onde tem comunidades organizadas tem floresta preservada!!!!!


sábado, 15 de junho de 2013

FIX - possibilidade de autonomia dos Povos Indígenas do Xingu ameaçados por Belo Monte


A ONG FASE, através do Fundo Dema e do Fundo Amazônia, lançou Chamada Pública de apoio a  pequenos projetos para Povos Indígenas da Região do Xingu pelo FIX (Fundo Indígena Xingu). 

Vídeo mostra que as lideranças indígenas querem acessar o FIX, no seu tempo, com autonomia. 

Clique aqui e veja vídeo com Uwira Xakriabá

Abaixo depoimento transcrito de mobilização dos "parentes" indígenas para acessarem o FIX, por Uwira, etnia Xakriabá, Associação Indígena Kirinapãn, município de Altamira (Pará) - 7 de junho de 2013.

Entrevista e imagens: Matheus Otterloo - Presidente do Fundo Dema-Fase Amazônia
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“Olá parentes, meu nome é Uwira, sou da etnia Xakriabá, sou membro da Associação Indígena Kirinapãn, de Altamira, aqui no Estado do Pará.
Hoje eu vim aqui para a gente conversar um pouquinho sobre o FIX. Pra gente entender um pouquinho o que é o FIX. Porque muitas vezes nas aldeias, nas Associações, os parentes perguntam: o que é o FIX? Como é que ele surgiu? De onde apareceu? De quem é essa ideia? O que é isso? 
O FIX é o Fundo de Apoio aos Povos Indígenas do Xingu. O FIX surge no momento em que o nosso Povo da Região do Xingu, embora eu mesmo não tenha nascido no Xingu mas moro aqui a mais de 15 anos e me entendo hoje como do Médio Xingu, vem sofrendo, sobretudo com a implantação da Usina Hidrelétrica de Belo Monte, do desmonte, da tentativa de reformulação da FUNAI e de todo esse processo que atropelou  todo o nosso povo nesses últimos anos, desde que voltou a se falar de Belo Monte e que se começou, de fato, a construção dessa barragem e tudo que ela trouxe.
A gente precisa fazer esse apanhado mais histórico do que vem acontecendo para a gente entender bem o que é o FIX e qual é a proposta do FIX. Que é um Fundo, de fato, indígena porque ele anda na contramão de todo o processo relacionado a Belo Monte.
Plano Emergencial de Belo Monte-impactos sobre a organização indígena: Todos os parentes se lembram que nós começamos nesse processo, com o chamado Plano Emergencial que colocava 30 mil Reais em cada aldeia sem distinção de quantas pessoas tinha, de quantas aldeias tinham, e a gente pulou de 17 aldeias para 37 em pouco tempo. Há aldeias que ainda estão desestruturadas, a maioria delas sem água, algumas sem luz, com situações complicadas. Desde a implantação desse projeto, todo nosso povo se voltou pra isso. Nesse sentido da organização política, da forma como vínhamos caminhando, houveram impactos muito negativos sobre nossa organização política e mesmo a organização de cada comunidade e vocês sabem disso melhor do que eu, da falta que os homens que estão sempre nas reuniões, então as roças acabam não saindo, ou saem menores do que deveriam, ou as pessoas não estão na época de queimar essas roças, ou na época da colheita, a farinha não está saindo porque é reunião, reunião, reunião... E aquele Plano Emergencial de 30 Mil que enchia nossas aldeias de coisas que muitas vezes nós não precisávamos e da retirada de uma certa autonomia que nós tínhamos e que até ela, foi nos sendo tirada, a partir do momento que a gente nem podia escolher o que iria comprar, com um recurso que, teoricamente, era nosso. A FUNAI precisava decidir. Vocês se lembram dessas falas: “vocês só vão comprar aquilo que eu autorizar. E de outras que surgiram nesse processo. 
E o FIX nasce justamente nesse meio, na contramão de tudo isso. Como um Fundo para pequenos, projetos pensados nas nossas comunidades, pro desenvolvimento das nossas comunidades, a partir de uma perspectiva que a gente precisa dar um passo de cada vez. Trabalhar com coisas, não pequenas, mas com coisas do nosso tamanho. Até que a gente cresça nesse caminho e possa desenvolver projetos maiores. 
Autonomia para os Povos: O FIX, ele tem entre vários outros méritos que eu considero, o grande mérito de mexer com a nossa autotomia. De nós andarmos sem estarmos escorados ou só por conta da construção da hidrelétrica ou de uma estrada ou do que quer que seja. É o nosso desenvolvimento por nós mesmos. Não porque agora vão fazer uma barragem no quintal da nossa casa e aí nós passamos a ser vistos e passamos a existir e, em parte, porque as nossas opiniões acabam não sendo consideradas. O FIX nasce nesse momento, dessa situação toda política, como uma proposta de autonomia, com uma proposta da gente direcionar. Que projetos nós queremos fazer? Não tem que ser o projeto que o técnico da Empresa A, B, C ou D veio e disse que é viável pra nossa aldeia. Não tem que ser o projeto que a FUNAI acha que a gente tem que fazer. É um projeto que respeita a nossa opinião, a nossa posição, que respeita as nossas instituições. O FIX trabalha com as organizações indígenas. Os projetos são enviados pelas organizações indígenas,  aprovados por um Comitê Gestor que é formado, na sua maioria, por indígenas, acompanhado também por indígenas, E isso nos dá essa autonomia". Nós não precisamos ir atrás da autorização da FUNAI, se a FUNAI concorda ou não que a gente quer caminhar para a direita ou pela esquerda. A decisão é nossa!

Estrada de possibilidades na contramão da Tutela: O FIX é esta estrada das nossas possibilidades, daquilo que nós podemos fazer. De onde podemos chegar? Na contramão dos megaprojetos, megaempreendimentos, que é Belo Monte e tudo o que ela representa pra nossa região. E que a gente já está vendo que cada dia anda mais devagar. Que as obras de saneamento básico ainda não saíram, que as escolas ainda não foram construídas, que o Plano Emergencial já terminou a um ano e que nada do Plano Básico Ambiental começou ainda. E isso vai acabar um dia. Tudo isso tem começo, meio e fim. É como se fosse uma bolha que uma hora vai estourar.  E depois a gente vai precisar andar com as próprias pernas. 
O FIX é esta chamada a consciência, se a gente ficar no colo da Norte Energia ou de quem quer que seja, do governo por muito tempo, a gente pode esquecer como é que a gente usa as pernas. O FIX vem na contramão da  tutela que é negada por um lado e reforçada pelo outro. Vem na contramão do paternalismo a partir do momento em que ele trabalha com nossos projetos, em que somos nós, avaliando, encaminhando, acompanhando esses projetos.
Lado a lado como parceiros: É uma tentativa pequena mas uma tentativa firme de nós termos autonomia, de nós caminharmos por nós mesmos, com respeito, como parceiros, caminhando lado a lado, nunca dando a mão e puxando a gente. Parceiro anda lado a lado. É essa nova realidade que a gente quer construir, de caminharmos como parceiros, com respeito, nos olhando de lado a lado. Não de cima pra baixo. Não sendo tratados como os incapazes, os tutelados, os que merecem pena, os que merecem que a gente diz, que se tenha dó, não! Com respeito a nossa dignidade como Povos Indígenas deste país. Por conta de toda história de colonização merecem respeito e consideração. É isso que nós como Povos Indígenas merecemos.
Sempre dispensamos aqueles que não são nossos parentes, talvez, por isso chegamos a condição a que chegamos. 
A gente espera ter no FIX esse apoio firme dos parentes. Esse apoio é manifesto na participação, no fortalecimento dessa ideia de que nós precisamos romper com a tutela, com o paternalismo e andar rumo a autonomia. Isso é o que prevê a Constituição Brasileira, a Convenção 169 da OIT, que são leis que foram os brancos que fizeram. Nós não participamos da elaboração delas. Que eles então observem as leis que eles fizeram. E que nos respeitem como a gente tem procurado respeitar nesses 500 anos, desde que eles chegaram aqui".

Veja mais sobre a Chamada na Página do Fundo Dema: http://www.fundodema.org.br/site/

10 Anos de Luta e Resistência 
Por Justiça Ambiental na Amazônia

Vejam uma experiência exitosa apoiada pelo
Fundo Dema com artesãos 
Munduruku de Itaituba-PA


sexta-feira, 14 de junho de 2013

Comida: Patrimônio histórico, cultural e imaterial

A crise alimentar não é uma crise apenas alimentar, mas uma crise de sistema, ou seja, estrutural, que está relacionada com a concentração da produção de commodities e com o abastecimento de alimentos nas grandes cadeias de supermercados”, afirma a Secretária Executiva do Fórum Brasileiro de Soberania e Segurança Alimentar e Nutricional – FBSSAN.
 comida mercaod
Questionar “que alimentos estamos comendo ou não estamos comendo” permite entender “como o sistema alimentar se estrutura e determina o que as pessoas comem ou deixam de comer”, aponta Vanessa Schottz à IHU On-Line. Secretária Executiva do Fórum Brasileiro de Soberania e Segurança Alimentar e Nutricional – FBSSAN, ela chama a atenção para a “padronização dos alimentos, que passam por um processo de industrialização crescente, tornando esses alimentos artificiais”.
Na entrevista a seguir, concedida por telefone, ela propõe rediscutir o conceito de qualidade e segurança em voga no código sanitário brasileiro. A qualidade dos alimentos, ressalta, “não pode ficar restrita a essa visão de assepsia e de somatória de nutrientes. (...) Temos de pensar numa perspectiva de assegurar o acesso das pessoas à alimentação em quantidade, mas também em qualidade. Não podemos falar de qualquer alimento, mas sim de alimentos que promovam a saúde, a segurança alimentar e nutricional. Por isso, enxergamos a Política Nacional de Agroecologia, lançada recentemente, como uma política que precisa ser fortalecida para apoiar a transição desse modelo”.
Vanessa Schottz é secretária Executiva do Fórum Brasileiro de Soberania e Segurança Alimentar e Nutricional – FBSSAN.
Confira a entrevista.
IHU On-Line – Quais foram as discussões centrais do 7º Encontro Nacional do Fórum Brasileiro de Soberania e Segurança Alimentar e Nutricional – FBSSAN?
Vanessa Schottz – O encontro centralizou a discussão em torno da questão: Que alimentos estamos comendo ou não estamos comendo? Essa discussão tem várias possibilidades de reflexão. Entre elas, entender como o sistema alimentar se estrutura e determina o que as pessoas comem ou deixam de comer. Diante desta reflexão, concluímos que a crise alimentar não é uma crise apenas alimentar, mas uma crise de sistema, ou seja, estrutural, que está relacionada com a concentração da produção de commodities e com o abastecimento de alimentos nas grandes cadeias de supermercados.
Quando nos questionamos sobre quais alimentos estamos comendo, nos damos conta do processo de envenenamento, uma vez que o Brasil é o maior consumidor de agrotóxicos do mundo e, a reboque, de transgênicos. Ao mesmo tempo, percebemos que tem um processo de padronização dos alimentos, que passam por um processo de industrialização crescente, tornando esses mesmos alimentos artificiais.
Discutimos também as normas sanitárias brasileiras, as quais tratam a pequena produção, os alimentos artesanais e tradicionais como indústria. Isso resulta num processo de padronização, que vai contra a soberania alimentar. Não defendemos uma flexibilização da norma, para que tenha uma perda na qualidade dos alimentos. Pelo contrário, queremos rediscutir esse conceito de qualidade e segurança em voga no atual Código Sanitário brasileiro, porque a qualidade dos alimentos também está relacionada com a contaminação dos agrotóxicos, com a produção de alimentos transgênicos. A qualidade não pode ficar restrita a essa visão de assepsia e de somatória de nutrientes. Precisam ter normas adequadas para a produção familiar, artesanal e tradicional, de forma a permitir que os consumidores consigam ter acesso a esses alimentos.
comida laboratorio
IHU On-Line – Em que consiste a compreensão do alimento como patrimônio cultural?
Vanessa Schottz – Nós valorizamos e fortalecemos a iniciativa do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional – IPHAN em reconhecer alguns ofícios, como o das baianas, que fazem o acarajé, e todo esse processo produtivo como um patrimônio do Brasil. Então, defendemos que, como a comida faz parte de um patrimônio histórico de um povo, todo o modo de fazer precisa ser reconhecido como um patrimônio cultural, imaterial e protegido para que não ocorra um processo sem precedente de padronização. A relação da dimensão cultural com a segurança alimentar e nutricional é um tema que ainda precisa ser explorado, mas que pode ser estruturante na medida em que nos ajuda a discutir o processo de produção alimentar, uma vez que, quando estamos falando desses alimentos tradicionais, estamos falando de um modo de saber fazer que é único, que tem a ver com o saber fazer que se passa de geração em geração e que tem tudo a ver com a identidade cultural, com o local, com o bioma.
O processo de expropriação do território indígena, de desestruturação dos modos de vida das comunidades, são ações que ferem a soberania alimentar e fazem com que perdemos o nosso patrimônio alimentar, seja pela extinção de alguns alimentos, seja pela tomada dos territórios pela monocultura. A comida é central para a construção da identidade dos povos, e todo esse processo de padronização alimentar que vem acontecendo também contribui para a perda da diversidade e para a padronização da cultura.
IHU On-Line – Como avalia o processo de produção de alimentos no país?
Vanessa Schottz – Ao fazer uma análise do sistema alimentar, percebemos que tem havido cada vez mais um aumento da produção de commodities, de grãos para a exportação, e isso tem tomado os territórios, aumentado o consumo de agrotóxicos e o uso de sementes transgênicas. Há uma concentração na cadeia produtiva de alimentos. Ao mesmo tempo, percebemos que esse processo não está descolado do consumo. O agronegócio desestrutura os modos de vida e transforma o lugar em um não lugar.
Ficamos preocupados ainda com o fato de o Brasil liberar agrotóxicos que foram proibidos em vários países. Na ponta do consumo, percebemos também que tem uma estratégia de mídia destinada ao público infantil, que estimula o consumo de uma série de alimentos que prejudicam a saúde, ricos em açúcar, gordura e sódio. O encontro apontou o aumento da obesidade no país, especialmente entre crianças e adolescentes.
IHU On-Line – Que avaliação faz das políticas públicas na área alimentar?
Vanessa Schottz – A carta política do encontro reconhece que as políticas públicas na área alimentar tiveram avanços nos últimos anos, especialmente no enfrentamento de uma das dimensões dos direitos da alimentação, que é o combate à fome. Foi aprovada a Lei Orgânica de Segurança Alimentar e Nutricional em 2006. Conseguimos incluir, em 2011, o direito humano à alimentação na Constituição Federal. Aprovamos, em 2009, a Lei da Alimentação Escolar, que obriga os municípios e os estados a utilizarem no mínimo 30% do valor transferido pelo governo federal para comprar alimentos da agricultura familiar. Essa política atende mais de 40 milhões de escolares por dia, e faz desse programa uma ação estruturante para a segurança alimentar porque, por um lado, fortalece a produção de alimentos e a geração de renda para a agricultura familiar e, por outro, insere no cardápio escolar uma alimentação saudável, composta de alimentos frescos como frutas, verduras e hortaliças.
Com isso podemos dizer que houve alguns avanços importantes no campo institucional da segurança alimentar, embora permaneçam muitos desafios, como o acesso à terra aos camponeses, a ocupação dos territórios pelos indígenas e quilombolas, porque a terra é o maior meio de produção de alimentos. Outro desafio é a questão de estruturar um novo modelo de produção de alimentos. Entre as alternativas que estão sendo construídas, tem a agroecologia, que produz alimentos sem venenos e de forma diversificada, respeitando os biomas e conservando a biodiversidade. O desafio é fazer a transição do modelo de produção atual, que é intensivo na mecanização, baseado na monocultura, no uso intensivo de agrotóxico, para um modelo agroecológico.
A segurança alimentar nutricional é uma pauta ainda estratégica. E mesmo com os avanços para enfrentar o problema da fome, ela [a fome] não foi totalmente vencida. Existe aí um desafio grande que é melhorar a qualidade da alimentação. Defendemos, portanto, o direito a uma alimentação adequada e saudável. Nesse aspecto, os programas de transferência de renda, como o Bolsa Família, é uma estratégia válida para o enfrentamento da pobreza.
IHU On-Line – Quais políticas poderiam reverter o quadro da fome no mundo?
Vanessa Schottz – Temos de pensar numa perspectiva de assegurar o acesso das pessoas à alimentação em quantidade, mas também em qualidade. Não podemos falar de qualquer alimento, mas sim de alimentos que promovam a saúde, a segurança alimentar e nutricional. Por isso, enxergamos a Política Nacional de Agroecologia, lançada recentemente, como uma política que precisa ser fortalecida para apoiar a transição desse modelo.
Também apostamos na agricultura urbana, ou seja, na produção de alimentos nos espaços urbanos e teleurbanos. Essa agricultura deve ser valorizada, protegida e precisa de políticas públicas que a promovam, porque ela cumpre um papel central na Política Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional. Seja porque ela permite o acesso ao alimento pela via do autoconsumo, seja porque ela está ajudando a discutir a democratização e a redemocratização dos espaços coletivos e o uso das cidades.
IHU On-Line – Gostaria de acrescentar algo?
Vanessa Schottz – Gostaria de ressaltar outra pauta importante, que tem a ver com a leitura que nós fizemos do sistema alimentar: a questão da regulação da publicidade de alimentos, principalmente aqueles voltados para a população infantil. Tem uma discussão sobre até que ponto seria censura ou não regular a publicidade das indústrias. Como entendemos que a publicidade é uma ação econômica, ela tem fins econômicos e, portanto, é passível de ser regulada pelo Estado, para que ele possa proteger o direito humano à alimentação e o direito à saúde, principalmente do público infantil. Consideramos estratégico avançar na regulação da publicidade de forma a proteger esse público, porque estudos mostram que a publicidade exerce influência sobre as escolhas alimentares.

(*) Fonte: Instituto Humanitas Unisinos.