sábado, 15 de junho de 2013

FIX - possibilidade de autonomia dos Povos Indígenas do Xingu ameaçados por Belo Monte


A ONG FASE, através do Fundo Dema e do Fundo Amazônia, lançou Chamada Pública de apoio a  pequenos projetos para Povos Indígenas da Região do Xingu pelo FIX (Fundo Indígena Xingu). 

Vídeo mostra que as lideranças indígenas querem acessar o FIX, no seu tempo, com autonomia. 

Clique aqui e veja vídeo com Uwira Xakriabá

Abaixo depoimento transcrito de mobilização dos "parentes" indígenas para acessarem o FIX, por Uwira, etnia Xakriabá, Associação Indígena Kirinapãn, município de Altamira (Pará) - 7 de junho de 2013.

Entrevista e imagens: Matheus Otterloo - Presidente do Fundo Dema-Fase Amazônia
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“Olá parentes, meu nome é Uwira, sou da etnia Xakriabá, sou membro da Associação Indígena Kirinapãn, de Altamira, aqui no Estado do Pará.
Hoje eu vim aqui para a gente conversar um pouquinho sobre o FIX. Pra gente entender um pouquinho o que é o FIX. Porque muitas vezes nas aldeias, nas Associações, os parentes perguntam: o que é o FIX? Como é que ele surgiu? De onde apareceu? De quem é essa ideia? O que é isso? 
O FIX é o Fundo de Apoio aos Povos Indígenas do Xingu. O FIX surge no momento em que o nosso Povo da Região do Xingu, embora eu mesmo não tenha nascido no Xingu mas moro aqui a mais de 15 anos e me entendo hoje como do Médio Xingu, vem sofrendo, sobretudo com a implantação da Usina Hidrelétrica de Belo Monte, do desmonte, da tentativa de reformulação da FUNAI e de todo esse processo que atropelou  todo o nosso povo nesses últimos anos, desde que voltou a se falar de Belo Monte e que se começou, de fato, a construção dessa barragem e tudo que ela trouxe.
A gente precisa fazer esse apanhado mais histórico do que vem acontecendo para a gente entender bem o que é o FIX e qual é a proposta do FIX. Que é um Fundo, de fato, indígena porque ele anda na contramão de todo o processo relacionado a Belo Monte.
Plano Emergencial de Belo Monte-impactos sobre a organização indígena: Todos os parentes se lembram que nós começamos nesse processo, com o chamado Plano Emergencial que colocava 30 mil Reais em cada aldeia sem distinção de quantas pessoas tinha, de quantas aldeias tinham, e a gente pulou de 17 aldeias para 37 em pouco tempo. Há aldeias que ainda estão desestruturadas, a maioria delas sem água, algumas sem luz, com situações complicadas. Desde a implantação desse projeto, todo nosso povo se voltou pra isso. Nesse sentido da organização política, da forma como vínhamos caminhando, houveram impactos muito negativos sobre nossa organização política e mesmo a organização de cada comunidade e vocês sabem disso melhor do que eu, da falta que os homens que estão sempre nas reuniões, então as roças acabam não saindo, ou saem menores do que deveriam, ou as pessoas não estão na época de queimar essas roças, ou na época da colheita, a farinha não está saindo porque é reunião, reunião, reunião... E aquele Plano Emergencial de 30 Mil que enchia nossas aldeias de coisas que muitas vezes nós não precisávamos e da retirada de uma certa autonomia que nós tínhamos e que até ela, foi nos sendo tirada, a partir do momento que a gente nem podia escolher o que iria comprar, com um recurso que, teoricamente, era nosso. A FUNAI precisava decidir. Vocês se lembram dessas falas: “vocês só vão comprar aquilo que eu autorizar. E de outras que surgiram nesse processo. 
E o FIX nasce justamente nesse meio, na contramão de tudo isso. Como um Fundo para pequenos, projetos pensados nas nossas comunidades, pro desenvolvimento das nossas comunidades, a partir de uma perspectiva que a gente precisa dar um passo de cada vez. Trabalhar com coisas, não pequenas, mas com coisas do nosso tamanho. Até que a gente cresça nesse caminho e possa desenvolver projetos maiores. 
Autonomia para os Povos: O FIX, ele tem entre vários outros méritos que eu considero, o grande mérito de mexer com a nossa autotomia. De nós andarmos sem estarmos escorados ou só por conta da construção da hidrelétrica ou de uma estrada ou do que quer que seja. É o nosso desenvolvimento por nós mesmos. Não porque agora vão fazer uma barragem no quintal da nossa casa e aí nós passamos a ser vistos e passamos a existir e, em parte, porque as nossas opiniões acabam não sendo consideradas. O FIX nasce nesse momento, dessa situação toda política, como uma proposta de autonomia, com uma proposta da gente direcionar. Que projetos nós queremos fazer? Não tem que ser o projeto que o técnico da Empresa A, B, C ou D veio e disse que é viável pra nossa aldeia. Não tem que ser o projeto que a FUNAI acha que a gente tem que fazer. É um projeto que respeita a nossa opinião, a nossa posição, que respeita as nossas instituições. O FIX trabalha com as organizações indígenas. Os projetos são enviados pelas organizações indígenas,  aprovados por um Comitê Gestor que é formado, na sua maioria, por indígenas, acompanhado também por indígenas, E isso nos dá essa autonomia". Nós não precisamos ir atrás da autorização da FUNAI, se a FUNAI concorda ou não que a gente quer caminhar para a direita ou pela esquerda. A decisão é nossa!

Estrada de possibilidades na contramão da Tutela: O FIX é esta estrada das nossas possibilidades, daquilo que nós podemos fazer. De onde podemos chegar? Na contramão dos megaprojetos, megaempreendimentos, que é Belo Monte e tudo o que ela representa pra nossa região. E que a gente já está vendo que cada dia anda mais devagar. Que as obras de saneamento básico ainda não saíram, que as escolas ainda não foram construídas, que o Plano Emergencial já terminou a um ano e que nada do Plano Básico Ambiental começou ainda. E isso vai acabar um dia. Tudo isso tem começo, meio e fim. É como se fosse uma bolha que uma hora vai estourar.  E depois a gente vai precisar andar com as próprias pernas. 
O FIX é esta chamada a consciência, se a gente ficar no colo da Norte Energia ou de quem quer que seja, do governo por muito tempo, a gente pode esquecer como é que a gente usa as pernas. O FIX vem na contramão da  tutela que é negada por um lado e reforçada pelo outro. Vem na contramão do paternalismo a partir do momento em que ele trabalha com nossos projetos, em que somos nós, avaliando, encaminhando, acompanhando esses projetos.
Lado a lado como parceiros: É uma tentativa pequena mas uma tentativa firme de nós termos autonomia, de nós caminharmos por nós mesmos, com respeito, como parceiros, caminhando lado a lado, nunca dando a mão e puxando a gente. Parceiro anda lado a lado. É essa nova realidade que a gente quer construir, de caminharmos como parceiros, com respeito, nos olhando de lado a lado. Não de cima pra baixo. Não sendo tratados como os incapazes, os tutelados, os que merecem pena, os que merecem que a gente diz, que se tenha dó, não! Com respeito a nossa dignidade como Povos Indígenas deste país. Por conta de toda história de colonização merecem respeito e consideração. É isso que nós como Povos Indígenas merecemos.
Sempre dispensamos aqueles que não são nossos parentes, talvez, por isso chegamos a condição a que chegamos. 
A gente espera ter no FIX esse apoio firme dos parentes. Esse apoio é manifesto na participação, no fortalecimento dessa ideia de que nós precisamos romper com a tutela, com o paternalismo e andar rumo a autonomia. Isso é o que prevê a Constituição Brasileira, a Convenção 169 da OIT, que são leis que foram os brancos que fizeram. Nós não participamos da elaboração delas. Que eles então observem as leis que eles fizeram. E que nos respeitem como a gente tem procurado respeitar nesses 500 anos, desde que eles chegaram aqui".

Veja mais sobre a Chamada na Página do Fundo Dema: http://www.fundodema.org.br/site/

10 Anos de Luta e Resistência 
Por Justiça Ambiental na Amazônia

Vejam uma experiência exitosa apoiada pelo
Fundo Dema com artesãos 
Munduruku de Itaituba-PA


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