A
agricultora gaúcha Rosiele Cristiane Luttki, 34 anos, trabalhou toda a
sua vida no campo. Para saber o que ia plantar costumava observar os
sinais da natureza, assim como faziam seu pai e seu avô. Dependendo do
jeito que o sol nascia e da posição do vento, sabia se ia chover ou não.
"Se dava três dias de vento na nascente, sabia que vinha chuva. Se no
final da tarde o sol entrasse na cor laranja, sabia que no dia seguinte
dava para trabalhar", lembra. "A gente seguiu esses sinais a vida toda.
Mas hoje em dia está tudo bagunçado."
Rosiele plantou fumo durante 15 anos e trabalha para diversificar sua
produção. No entanto, com a seca que afeta o Sul, apesar de ter
plantado milho e feijão, nada colheu. E os problemas não acabaram por
aí. Rosiele tem dívidas para pagar. A agricultora está devendo R$ 2.600
por conta das sementes que comprou. Não recebeu o seguro do Programa de
Garantia da Atividade Agropecuária (Proagro), pois não conseguiu plantar
toda a sua área, conforme manda o programa, e ainda precisa pagar cinco
parcelas anuais de R$ 1.800 referentes ao investimento em equipamentos
de irrigação feito pelo Pronaf.
Num cenário de incertezas, os chamados sistemas agroecológicos
aparecem como uma alternativa mais sustentável para o agricultor.
"Queremos deixar a forma de produção convencional e fazer a transição
para a agroecologia, que inclui adubação verde, policultivo e uso da
própria semente", diz.
"Quem mora no campo já sente os efeitos das mudanças climáticas há
pelo menos dez anos", diz frei Sérgio Gorgen, representante do Movimento
dos Pequenos Agricultores, ligado a Via Campesina. Segundo ele, o Rio
Grande do Sul vive uma de suas piores estiagens. "A última chuva na
região foi no mês de novembro. Agora já vai entrar novamente o período
de inverno e mais uma seca", diz.
"Tínhamos a percepção de que essas mudanças iriam demorar muito para
chegar. Mas hoje em dia quem está no campo já sente na pele o que está
acontecendo", diz Rosicléia dos Santos, secretária de Meio Ambiente da
Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura (Contag). As
áreas mais afetadas, segundo ela, são as regiões Norte e Nordeste do
país. Em algumas regiões do semiárido do Nordeste não chove há dois
anos. Essas áreas já enfrentam problemas de desertificação.
"No entanto, é preciso mudar o sistema de produção e fazer políticas
que alcancem os pequenos agricultores", diz Rosicléia. Ao lado da
Articulação Nacional de Agroecologia (ANA), a Contag e outros movimentos
de pequenos agricultores levaram propostas para o governo para a
elaboração da Política Nacional de Agroecologia que deve ser lançada
durante a Rio+20.
"O Brasil investiu muito cedo na expansão do modelo de agricultura
convencional que utiliza fertilizantes químicos e agrotóxicos no
controle de pragas", afirma Flávia Londres, agrônoma da Esalq, que
assessora ONGs e movimentos sociais em assuntos ligados à
agrobiodiversidade. "Por outro lado, nenhuma política foi criada para
incentivar sistemas de produção mais harmônicos, como a agroecologia",
diz.
Segundo Paulo Guilherme, secretário de extrativismo e desenvolvimento
rural do Ministério do Meio Ambiente, o conteúdo da Política Nacional
de Agroecologia ainda está em discussão, mas o governo trabalha com o
horizonte de apresentá-la durante a reunião. A política deve prever
financiamento, abertura de mercados e formas de incentivo para fazer a
transição para o novo sistema. As medidas que compõem o plano de
implementação devem ser estabelecidas até 2014.Sistemas de irrigação e crédito sempre foram as grandes demandas. Segundo frei Sérgio, "o governo precisa deixar de estimular as monoculturas e aumentar o crédito para a agroecologia."
(*) Matéria de Giselle Paulino no jornal Valor Econômico.
Fonte: http://agroecologia.org.br/index.php/noticias/208-agricultores-veem-na-agroecologia-a-alternativa-para-o-problerma-da-seca
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