Por Vilmon Ferreira
Nos dias 22 a 25 de outubro/13
tive o privilegio de participar de uma caravana que me lembrou da história das
caravelas de Cabral. Sem nenhum sentido de comparação dos objetivos de ambas,
mas me senti descobrindo a amazônia brasileira num barco, hoje movido a motor.
Aliás, o objetivo de nossa caravana teve um sentido de pura “boas intenções”,
muito diferente das caravelas de Cabral.
Voltando a Santarém, por
sinal, terras abençoadas pelos bons espíritos das florestas e das águas,
realmente encantada amazonia. Bem, a caravana foi dividida em dois grupos para
visitar duas áreas: a da FLONA Tapajós (Floresta Nacional) no planalto e a
Reserva Extrativista Tapajós-Arapiuns.
Fui escalado, imaginem, para
compor a caravana da Resex Tapajós – Arapiuns para navegar num belíssimo barco,
com mais 35 compas agroecológicos, também privilegiados, por embrenharem-se
nestas lendárias águas do Rio Tapajós.
Caravana esta, liderada por ninguém menos que um santareno, paraense
legítimo, Sr. Antonio e que humildemente batizado e chamado por estas mesmas
águas sagradas de: “mucura”. Um cidadão
nativo da amazônia de 75 anos, com energia juvenil extraídas, com certeza desta
mesma natureza, aliás, o Sr mucura foi mais que um guia para a nossa caravana, e
sim, uma figura humana emblemática de sapiência antropológica. Uma liderança
que lutou pela criação da reserva extrativista Tapajós Arapiuns. Criada em 1998
como unidade de conservação de uso sustentável com 677.000 hectares em que é
composta por 73 comunidades (7 aldeias indígenas, 10 comunidade mistas, 56
comunidades não indígenas), vivendo ali mais de 3 mil famílias. Esta Resex é
atualmente presidida pela liderança jovem, Leonidas, ao qual também agradecemos por nos acompanhar
nesta viagem. Nosso tempo foi muito curto, por isso conseguimos visitar apenas
3 comunidades, duas indígenas (Solimões e Santo Amaro) e Surucuá (famílias
extrativistas/agricultura familiar).
Em todas as comunidades, sem
exceção, fomos prazerosamente recebidos com muita festa cultural regado a uma
diversidade alimentar e bebidas típicas. Uma constatação essencial para
agroecologia, em todas as comunidades em que visitamos, valorizam e preservam muito
sua cultura. Por exemplo, no caso das comunidades indígenas tem professoras que
ensinam sua língua de origem: yane kwema (bom dia!) e seguem seus ritos
culturais.
Nesta missão, olhamos por
demais, com intuito de observar a agroecologia para além dos aspectos técnicos produtivos,
ou seja, vivenciar as relações sócio-culturais e produtivos da comunidade como
um todo. Para terem uma idéia, a
floresta para os povos na amazônia é um elemento significativo em suas vidas:
lá fazem seus pequenos roçados que plantam mandioca, feijão, cará, milho e além
de uma diversidade de frutas, como açaí, bacaba, curuá, etc, também trabalham
com a borracha da seringa e a farinha da mandioca, dois produtos básicos para
gerar renda. Desta floresta e das águas provem as lindas histórias lendárias
que alimentam a cultura deste povo, Sr. Mucura que o diga.
Desta forma, a caravana
comprovou e reafirmou o nosso conceito de agroecologia, ou seja, a diversidade
sócio-produtivo, e com seus direitos territoriais assegurados, as pessoas
destas comunidades (adultos, idosos, jovens, crianças) são felizes, preservam
sua cultura e vivem bem nutridas por uma diversidade de alimentos saudáveis
produzidos ali, os produtos que comercializam são de extrema qualidade, com
destaque para a farinha. Da mandioca também extraem deliciosas bebidas como
caxiri e tarubá servidos nas festas culturais. Os antigos problemas são recorrentes não só
aqui, mas em todo território nacional, as políticas estruturantes como
transporte, energia e equipamentos para o beneficiamento da produção não chegam
lá na ponta. Estas comunidades ainda necessitam de capacitação, informação e
acima de tudo de organização, apesar do esforço incomunal do Sindicato dos
Trabalhadores (as) Rurais de Santarém e de outras Ongs da região. O problema da
DAP (Declaração de Aptidão ao Pronaf) é o mais grave, pois dificultam a se
organizarem para acessar, por exemplo, os Programas PAA (Programa de Aquisição
de Alimentos) e PNAE (Programa Nacional de Alimentação Escolar). Para minha
surpresa, a Educação tem uma relação bastante interessante nestas comunidades,
são professores (as) que se formam da própria comunidade e voltam para ensinar
e repassar os conhecimentos para suas gerações. Imaginem se os programas PAA e
PNAE fossem acessados e a produção destas comunidades adquiridos para
alimentação da própria escola, seria de fato e de direito os passos da
agroecologia sendo consumados. Mas infelizmente isso não ocorre, ainda as
escolas são alimentadas pela prefeitura por enlatados, conservas e biscoitos de
péssima qualidade nutricional e às vezes não vem em quantidade suficientes.
Os desafios ainda continuam para estas organizações de
base, como STTRs e Ongs de educação popular de levar a informação e organizar
coletivamente para que estes povos da floresta e das águas possam acessar e
conquistar políticas públicas. Ou seja, se organizarem para cobrar do governo
que faça sua parte.
Enviado Guilherme Carvalho ONG FASE Amazônia
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