Os 145
indígenas dos rios Xingu, Tapajós e Teles Pires, no Pará, ocuparam a sede da
Fundação Nacional do Índio (Funai), em Brasília, na tarde desta segunda-feira,
10. Os indígenas aguardavam a presidente interina do órgão indigenista, Maria
Augusta Assirati, para entregar documento com reivindicações, solicitar
hospedagem e a data em que seriam levados de volta ao Pará. Porém, Maria
Augusta não compareceu e por emissários avisou que estava em outra reunião.
Nesta terça-feira, 11, completa uma semana que o grupo desocupou o principal
canteiro de obras da UHE Belo Monte e veio ao Distrito Federal.
“Desde a
manhã estamos esperando alguém da Funai para falar da nossa pauta, da
hospedagem. Ninguém apareceu até agora. Nós chamamos vocês para nossa
assembleia, que começou quando chegamos, e vocês não vieram. Então
estamos informando agora para vocês que nos estamos acampando aqui na Funai.
Vamos ocupar a Funai a partir de agora”, disse Josias Munduruku aos
representantes delegados pela interina da Funai.
O grupo já
demonstrava indignação com a postura do ministro-chefe da Secretaria Geral da
Presidência da República (SGPR), Gilberto Carvalho, que na manhã desta segunda
negou reunião com os indígenas. Ao invés do ministro, quem recebeu os indígenas
foram soldados do Exército e assessores. Pelo próprio governo, os indígenas
foram encaminhados para a Funai, onde seriam recebidos pela presidente
interina. Até o final da tarde de hoje, Maria Augusta não apareceu.
“Disseram
(na SGPR) que receberiam uma comissão de dez, mas nós não nos separamos. O
governo não quer entender isso, respeitar nosso jeito. Sabem que não nos
separamos. Por essa postura, o ministro descumpre os acordos e assim fica
difícil conversar”, explica Jairo Saw, assessor do cacique-geral Munduruku.
Para as lideranças, os assessores de Carvalho disseram que ele só poderia
atendê-los até as 11h15. Em nota, a SGPR disse que as lideranças indígenas se
negaram a se reunir com Gilberto Carvalho.
“O governo
está dando as costas para nós. Não quer nos ouvir. Nós estamos entendendo isso.
Ele disse que vai fazer hidrelétricas de qualquer jeito, e ele sabe que nós não
queremos. Essa nota do governo nós lemos na reunião. Ele disse que esperou a
gente, disse que nos recusamos. É mentira! Foi ao contrário. Nós fomos lá, nós
que esperamos”, disse Josias Munduruku para os emissários de Maria Augusta.
O povo
Munduruku interpelou judicialmente, no início deste mês, o ministro Carvalho
por outra nota da SGPR, onde acusa “autodenominadas” lideranças de envolvimento
com atividades ilícitas. Leia matéria na íntegraaqui.
Carta
protocolada; carta não recebida
Os
indígenas, mesmo sem serem recebidos, protocolaram na SGPR o documento que
entregariam ao ministro em mãos – leia a íntegra aqui.
Na carta, os indígenas relatam ponto a ponto as áreas afetadas pelo projeto
hidrelétrico nos rios Teles Pires e Tapajós – motivo pelo qual o grupo ocupou
no mês de maio, por 17 dias em duas ocasiões, o principal canteiro das obras da
UHE Belo Monte. Um dos locais atingidos é a Cachoeira Sete Quedas, sagrado para
os Munduruku, Kayabi e Apiaká, que será inundada pela usina que está sendo
construída no Teles Pires.
“A
Cachoeira de Sete quedas (Paribixexe): É uma linda cachoeira contendo sete
quedas em formato de escada. É o lugar onde os mortos estão vivendo, o céu dos
mortos, ou seja, o mundo dos vivos, o reino dos mortos. É um local sagrado para
os Munduruku, Kayabi e Apiakás, aonde também os peixes se procriam e diversas
espécies e todos os tamanhos, onde existe a mãe dos peixes. Nas paredes constam
as pinturas rupestres deixados pelo Muraycoko (pai da escrita), a escrita
deixada para os Munduruku através das escritassurabudodot, por muito
tempo remoto (sic)”, diz trecho da carta.
Para
Valdenir Munduruku, o ministro Carvalho demonstra com as atitudes apresentadas
a forma de diálogo que pretende manter: “Aqui, a casa deles, nos recebem com o
Exército e a polícia e não nos deixam entrar. Em nossa casa, mandam o Exército
e a polícia para poderem entrar. Isso não é diálogo. É como se nós fôssemos
inimigos”. Josias Munduruku lembra que na reunião da última terça-feira, 4, o
ministro disse que as hidrelétricas vão sair, pois se trata de uma decisão de
governo: “Me pergunto: que consulta é essa que eles querem fazer? Não é
consulta quando eles (governo) tomam uma decisão sem volta. O que poderá sair
de consulta assim?”, questiona.
Por
enquanto, não há previsão de retorno dos indígenas para o Pará e de desocupação
do órgão indigenista estatal, a Funai. Tampouco a hospedagem ficou definida,
mas, pelo visto, depois do anúncio da ocupação à sede da Funai, os indígenas já
arrumaram um lugar para ficar - ao menos por essa noite.
Foto:
Fábio Rodrigues Pozzebom/ABr
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