sábado, 25 de maio de 2013

Avia Terai, uma cidade marcada pelos males da agroquímica na Argentina


Um estudo interdisciplinar, patrocinado pelo Ministério da Saúde da Nação (Argentina), mostrou que em Avia Terai, uma cidade localizada na província de Chaco, rodeada de campos de soja, continuamente fumigados, mais de 30% da população possui um parente com câncer.

A reportagem é de Dario Aranda, publicada no jornal Página/12, 20-05-2013. A tradução é do Cepat.
Fonte: http://goo.gl/iRakp
Avia Terai é uma localidade com cinco mil habitantes, no centro geográfico de Chaco (nordeste argentino). A área urbana está, literalmente, rodeada de plantações de soja e girassol, que são fumigadas de dez a doze vezes por ano. Um estudo científico confirmou a denúncia de vizinhos: 31,3% da população destacada declaram que tiveram algum familiar com câncer. Os altíssimos índices de câncer, e também de deficiência, repetiram-se em outras três cidades cercadas por campos transgênicos: Campo Largo, Napenay e La Leonesa. Foi o que revelou um estudo interdisciplinar, realizado durante um ano e patrocinado pelo Ministério da Saúde da Nação (Argentina). A pesquisa relaciona a causa das enfermidades com o modelo agropecuário.
Relação entre o uso de agroquímicos e a condição de saúde”. Este é o nome da pesquisa, de 68 páginas, que contou com 2051 observações no território, utilizou dados oficiais e que foi realizada por seis médicos, licenciados em enfermagem e geógrafos.
Na entrada de Avia Terai existe uma empresa de sementes transgênicas (Mandiyú) e uma agroquímica (Ciagro), com campos experimentais. Chegando ao povoado, destaca-se uma pista de aviões para fumigação. Também está presente a multinacional cerealista Bunge, com carga-descarga de caminhões. Em Avia Terai, foram entrevistadas 390 pessoas sendo que, entre elas, 31,3% da população declararam ter contado com algum familiar com câncer, nos últimos dez anos.
“No Centro Integrador Comunitário (CIC) nos entregaram um censo realizado pelas próprias mulheres do povoado, que solicitam uma escola para deficientes. Somente entre os menores de 20 anos, da área urbana, contaram 101 crianças e jovens com deficiência”, destaca o trabalho.
Na localidade de Campo Largo, 10% das mulheres e 15% dos homens manifestaram ter algum tipo de deficiência e 29,8% reconheceram que tiveram familiares com câncer, nos últimos dez anos. Em Napenay, 20% dos homens manifestaram ter algum tipo de deficiência e 38,9% apontaram a existência de algum familiar com câncer. Em La Leonesa, região arrozeira, 27,4% da população declararam ter familiares com câncer.
“As quatro localidades caracterizadas como assentamentos, nas quais se desenvolve o modelo agroprodutivo, empregando os pacotes tecnológicos que incluem sementes transgênicas e o emprego de agroquímicos, têm respostas acima de 20%, chegando até 38%, ao mesmo tempo em que as duas localidades caracterizadas como pecuaristas chegam a valores muito baixos”, alerta a pesquisa.
Para o seu relatório epidemiológico, a pesquisa tomou como fontes de informação os estudos da Direção de Estatística Sanitárias, do Ministério da Saúde de Chaco, e o Registro de Tumores de Chaco, do Serviço de Neonatologia do Hospital Perrando e do Hospital 4 de Junho, além das próprias pesquisas no  território. E explicaram que priorizaram os casos de tumores e as malformações congênitas, pois “associam-se à exposição com agroquímicos”.
Os produtos de maior uso na área são endosulfan, clorpirifós, glifosato, paraquat, dimetoato, lambdaciaotrina, metamidofós, cipermetrina e carbendazim, entre outros.
O trabalho detalha uma bibliografia científica que adverte sobre as malformações e câncer nas áreas com uso intensivo de agrotóxicos, recorda que a aparição de ervas daninha resistentes fez com que “para sustentar a produtividade, sejam aplicadas quantidades cada vez maiores de agroquímicos”, e lembra que os mais atingidos são crianças e mulheres grávidas.
Alejandra Gómez, da Rede de Saúde Popular Ramón Carrillo, trabalha junto às populações fumigadas de Chaco e não duvida: “Continua-se priorizando a ‘produtividade’ e o rendimento do agronegócio, sem levar em conta os custos sociais e ambientais, nem a saúde e a vida. As leis não são cumpridas e o Estado continua ausente em matéria ambiental. Deve ficar claro que junto com o avanço da fronteira agrícola, avança o desmonte e as enfermidades na população”.
A pesquisa cita estudos científicos e afirma as consequências do modelo: “Redução da fertilidade masculina, enfermidades neurológicas, redução do crescimento, anormalidades fetais, fadiga crônica em crianças e Mal de Parkinson. Também está contribuindo enormemente para o aumento do índice de câncer, já que os resíduos de pesticidas estão entre as três maiores causas de câncer”.
No capítulo final, os pesquisadores afirmam que “é possível compatibilizar o desenvolvimento dos povos com a saúde e a educação, preservando o território para gerações futuras”, recorda a sentença judicial, que freou fumigações na localidade de La Leonesa, mas adverte que em muitas outras cidades “a população ainda continua esperando e, por isso, acreditamos que é necessário atuar de forma mais rápida diante das situações em que se prejudica a saúde”. Destaca que no país conseguiram “erradicar muitas enfermidades, que durante anos causaram mortes e postergaram”, e revela a razão da pesquisa: “Não queremos ficar silenciosos diante de novas ameaças”.

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