quarta-feira, 29 de fevereiro de 2012

O que são 'serviços ambientais', 'pagamento por serviços ambientais' e 'comércio em serviços ambientais'?


´Serviço ambiental´, também chamado de ´serviço ecossistêmico´, inclui o substantivo ´serviço´, um termo bastante utilizado na economia capitalista de mercado, na qual atuam empresas e profissionais que prestam os mais variados serviços e cobram por isso.  Portanto, o´serviço ambiental´ sugere que tem, por um lado, algo ou alguém que o presta ou providencia e, por outro lado, alguém que o recebe e o utiliza.  Essa lógica parece se aplicar também no caso do ´serviço ambiental´ e seu ´comércio´.

Entretanto, há algo particular no caso do ´serviço ambiental´.  Ele não é ´prestado´ por uma pessoa ou empresa, é simplesmente ´ofertado´ pela natureza e de forma gratuita.  Os defensores dos ´serviços ambientais´ dão como exemplo áreas de floresta que, devido à sua vegetação densa, conseguem ´armazenar´ e ´produzir´ o ´serviço ambiental´ água que, por sua vez, garante o abastecimento de uma aldeia indígena que vive nessa floresta e de um pequeno vilarejo nas proximidades.  Parece que a ´natureza´ está, neste caso, sendo transformada em uma espécie de ´fábrica de água´!  Como veremos depois, há muitos interesses corporativos vinculados a esse processo.

A bióloga americana Gretchen Daily, uma defensora da ideia de ´serviços ambientais´, formulou sua concepção sobre o tema da seguinte forma: "as condições e os processos através dos quais ecossistemas naturais e as espécies que fazem parte deles sustentam e realizam a vida humana".  Ela argumenta que ´serviços ambientais´ garantem a biodiversidade de ecossistemas e resultam em ´bens´ como madeira, alimentos, plantas medicinais que, por sua vez, são transformados em produtos importantes para a vida humana (3) .

Outros autores (4), da Europa e dos EUA, falam em 'funções ambientais´, não apenas pensando nos ´serviços prestados´ para o ser humano, mas em ´funções´ essenciais para manter a vida no planeta, tais como:

- funções de regulação: trata-se de funções que regulam processos ecológicos e sistemas que dão suporte à vida no planeta.  São essas funções que fornecem muitos serviços benéficos direta ou indiretamente para o ser humano, como água e ar limpos, solo fértil e o controle biológico de pragas;

- funções chamadas de ´habitat´: relaciona-se com a função dos ecossistemas naturais de garantir um refúgio e condições para a reprodução de plantas e animais silvestres, o que contribui para a conservação da diversidade biológica e genética;

- funções produtivas: o processo de crescimento, inclusive absorção de carbono (CO2) e nutrientes do solo e produção de biomassa.  Isso resulta em muitos alimentos, matérias primas para todo tipo de uso e fontes de energia para comunidades;

- funções de informação e outras que incluem oportunidades de reflexão, enriquecimento espiritual e lazer.

Fala-se de ´Pagamento por Serviços Ambientais´ quando alguém paga uma determinada quantia de dinheiro, um preço, por um determinado ´serviço ambiental´ prestado.  É óbvio que a natureza, no exemplo da floresta que ´armazena´ e ´produz´ água, não tem conta bancária para receber dinheiro por ter ´prestado´ esse ´serviço´.  É aí que os defensores da ideia afirmam que é preciso ter alguém ou alguma instituição para receber o pagamento, mas sempre com a condição de ser o ´dono´ daquela floresta, e também alguém disposto a comprar o referido serviço, a partir do qual começa o ´comércio em serviços ambientais´.

Apesar de haver muitos outros ecossistemas além de florestas, como, o cerrado, o pasto natural e os mares, as florestas são, sem dúvida, o principal ecossistema em questão quando se trata de projetos de ´pagamento e comércio em serviços ambientais´, segundo afirmam os defensores da ideia.  Isso ocorre devido à sua enorme riqueza em termos de biodiversidade e, portanto, à grande quantidade de ´serviços prestados´, como a conservação de água e a absorção e armazenamento de carbono, dentre outros aspectos.

Dentro dessas florestas, há centenas de milhões de pessoas, os povos da floresta, que dependem totalmente das mesmas para sua sobrevivência física e cultural.  Uma moradora da comunidade de Katobo, que vive na floresta no Leste da República Democrática do Congo, território de Walikali, relata o significado da floresta para ela: "Somos felizes com nossa floresta.  Na floresta, coletamos lenha, cultivamos alimentos e comemos.  A floresta fornece tudo, legumes, todo tipo de animal e isso nos permite viver bem.  É por isso que somos muito felizes com nossa floresta, porque nos permite conseguir tudo que precisamos.  E nós, as mulheres, precisamos da floresta em especial porque é onde encontramos tudo que precisamos para alimentar nossas famílias.  Quando ouvimos que a floresta poderia estar em perigo, isso nos preocupa, porque nunca poderíamos viver fora da floresta.  E se alguém nos dissesse para abandonar a floresta, ficaríamos com muita raiva, porque não podemos imaginar uma vida que não é dentro ou perto da floresta.  Quando plantamos alimentos, temos comida, temos agricultura e também caça, e as mulheres pegam siri e peixe nos rios.
Temos diferentes tipos de legumes, e também plantas comestíveis da floresta, e frutas, todo de tipo de coisa que comemos, que nos dá força e energia, proteínas e tudo mais que precisamos."(5)

No entanto, a ideia dos ´serviços ambientais´ é bem diferente da visão expressa nesse depoimento.  O ´comércio em serviços ambientais´, por ser um negócio entre um vendedor e um comprador, é um mecanismo de mercado em que a natureza é transformada em ´unidades quantificadas, em ´bens´ comerciáveis, também chamados de ´certificados´, ´títulos´ ou ´ativos´.  E mais, supõe-se ainda a ideia de lucrar com esse ´comércio´ e de poder destruir os ´serviços ambientais´ em um lugar sempre se for acompanhado por uma ´proteção´, ´recuperação´ ou
´melhoria´ em outro.  Portanto, o ´comércio em serviços ambientais´ é algo radicalmente diferente da forma como os povos sempre vinham valorizando a floresta.  Portanto, vale verificar como a ideia sobre os tais ´serviços ambientais´ surgiu.


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1 - Por mercantilização da natureza, falamos do processo de realizar transações comerciais e negócios com os bens da natureza, seja pela extração de elementos concretos, como a madeira, ou engarrafamento de água mineral; seja pela comercialização de componentes mais abstratos da natureza, como a biodiversidade, a fertilidade do solo, o carbono, a beleza da paisagem, o abrigo de uma floresta para as espécies, etc.

2 - Por financeirização da natureza, nos referimos ao processo pelo qual o capital especulativo se apropria de bens e componentes da natureza, comercializando-os através de certificados, de títulos, de ativos, etc., buscando, com a especulação financeira, a obtenção do maior lucro possível.

3 - Daily, G, 1997.  Introduction: What Are Ecosystem Services?  In Daily, G. (edt), Nature's Services.  Societal Dependence on Natural Ecosystems, Island Press, Washington DC.  Informações do Glossary elaborado para o curso sobre Ecological Economics and Political Ecology do projeto EJOLT, coordenado pela Universidade Autonoma de Barcelona
4 - de Groot, R., 1994.  Environmental functions and the economic value of natural ecosystems.  In: A.M. Jansson, (Editor), Investing in Natural Capital: The Ecological Economics Approach to Sustainability, Island Press, pp.  151-168.; de Groot, R., M. Wilson, R. Boumans,
2002.  A typology for the classification, description and valuation of ecosystem functions, goods and services, Ecological Economics, 41, 393-408.  Informações do Glossary elaborado para o curso sobre Ecological Economics and Political Ecology do projeto EJOLT, coordenado pela Universidade Autonoma de Barcelona 5 - WRM, "Forests.
Much more than a lot of trees".  Video, www.wrm.org.uy, 2011

Número 175 - Fevereiro 2012

Fonte: World Rainforest Movement - Uruguay
Enviado por Edmilson Pinheiro

terça-feira, 28 de fevereiro de 2012

Em dez anos, 42 mil mulheres foram assassinadas no País, diz relatora


A relatora da Comissão Parlamentar Mista de Inquérito (CPMI) sobre a violência contra a mulher no Brasil, senadora Ana Rita (PT-ES), afirmou há pouco que, entre 1998 e 2008, 42 mil mulheres foram assassinadas no País. 

Citando dados da Secretária de Políticas Públicas para as Mulheres da Presidência da República e do Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos ( Dieese), Ana Rita informou que o número de denúncias recebidas pelo serviço Disque 180 cresceu 16 vezes entre 2006 e 2010. “As estatísticas mostram que quatro em cada dez mulheres já foram vítimas de agressão no Brasil. Foi com base nesses números que justificamos a criação desta CPI”, explicou.

De acordo com a senadora, o cronograma de trabalho da comissão será apresentado apenas na semana que vem. Ela adiantou, contudo, que será necessário realizar visitas a autoridades como ministros de Estado, procuradores e defensores públicos. “Precisaremos também do apoio de instituições como o Ministério Público e a Polícia Federal”, acrescentou.

Delegacias e varas
A presidente da CPMI, deputada Jô Moraes (PCdoB-MG), destacou que é preciso investigar as dificuldades dos órgãos de proteção à mulher, com delegacias e varas especializadas. “Em Minas Gerais, por exemplo, existem 40 mil processos relacionados à violência contra as mulheres, e apenas duas varas especializadas”, exemplificou. 

A reunião ocorre na sala 2 da Ala Senador Nilo Coelho, no Senado.

Manifesto das Organizações Sociais do Campo - Luta Unificada

As entidades: APIB, CÁRITAS, Cimi, CPT, CONTAG, FETRAF, MAB, MCP, MMC, MPA e MST, presentes no Seminário Nacional de Organizações Sociais do Campo, realizado em Brasília, nos dias 27 e 28 de fevereiro de 2012, deliberaram pela construção e realização de um processo de luta unificada em defesa da Reforma Agrária, dos direitos territoriais e da produção de alimentos saudáveis.

Considerando:

1) O aprofundamento do capitalismo dependente no meio rural, baseado na expansão do agronegócio, produz impactos negativos na vida dos povos do campo, das florestas e das águas, impedindo o cumprimento da função socioambiental da terra e a realização da reforma agrária, promovendo a exclusão e a violência, impactando negativamente também nas cidades, agravando a dependência externa e a degradação dos recursos naturais (primarização).

2) O Brasil vive um processo de reprimarização da economia, baseada na produção e exportação de commodities agrícolas e não agrícolas (mineração), que é incapaz de financiar e promover um desenvolvimento sustentável e solidário e satisfazer as necessidades do povo brasileiro.

3) O Agronegócio representa um pacto de poder das classes sociais hegemônicas, com forte apoio do Estado Brasileiro, pautado na financeirização e na acumulação de capital, na mercantilização dos bens da natureza, gerando concentração e estrangeirização da terra, contaminação dos alimentos por agrotóxicos, destruição ambiental, exclusão e violência no campo, e a criminalização dos movimentos, lideranças e lutas sociais.

4) A crise atual é sistêmica e planetária e, em situações de crise, o capital busca saídas clássicas que afetam ainda mais os trabalhadores e trabalhadoras com o aumento da exploração da força de trabalho (inclusive com trabalho escravo), super exploração e concentração dos bens e recursos naturais (reprimarização), flexibilização de direitos e investimento em tecnologia excludente e predatória.

5) Na atual situação de crise, o Brasil, como um país rico em terra, água, bens naturais e biodiversidade, atrai o capital especulativo e agroexportador, acirrando os impactos negativos sobre os territórios e populações indígenas, quilombolas, comunidades tradicionais e camponesas. Externamente, o Brasil pode se tornar alavanca do projeto neocolonizador, expandindo este modelo para outros países, especialmente na América Latina e África.

6) O pensamento neodesenvolvimentista centrado na produção e no lucro, defendido pela direita e por setores de esquerda, exclui e trata como empecilho povos indígenas, quilombolas e camponeses. A opção do governo brasileiro por um projeto neodesenvolvimentista, centrado em grandes projetos e na exportação de commodities, agrava a situação de exclusão e de violência. Consequentemente não atende as pautas estruturais e não coloca a reforma agrária no centro da agenda política, gerando forte insatisfação das organizações sociais do campo, apesar de pequenos avanços em questões periféricas.

Estas são as razões centrais que levaram as organizações sociais do campo a se unirem em um processo nacional de luta articulada. Mesmo reconhecendo a diversidade política, estas compreendem a importância da construção da unidade, feita sobre as bases da sabedoria, da maturidade e do respeito às diferenças, buscando conquistas concretas para os povos do campo, das florestas e das águas.

Neste sentido nós, organizações do campo, lutaremos por um desenvolvimento com sustentabilidade e focado na soberania alimentar e territorial, a partir de quatro eixos centrais:

a) Reforma Agrária ampla e de qualidade, garantia dos direitos territoriais dos povos indígenas e quilombolas e comunidades tradicionais: terra como meio de vida e afirmação da identidade sociocultural dos povos, combate à estrangeirização das terras e estabelecimento do limite de propriedade da terra no Brasil.

b) Desenvolvimento rural com distribuição de renda e riqueza e o fim das desigualdades;

c) Produção e acesso a alimentos saudáveis e conservação ambiental, estabelecendo processos que assegurem a transição para agroecológica.

d) Garantia e ampliação de direitos sociais e culturais que permitam a qualidade de vida, inclusive a sucessão rural e permanência da juventude no campo.

Este é um momento histórico, um espaço qualificado, com dirigentes das principais organizações do campo que esperam a adesão e o compromisso com este processo por outras entidades e movimentos sociais, setores do governo, parlamentares, personalidades e sociedade em geral, uma vez que a agenda que nos une é uma agenda de interesse de todos e todas.

Brasília, 28 de fevereiro de 2012.

APIB – Articulação dos Povos Indígenas do Brasil
CÁRITAS Brasileira
Cimi – Conselho Indigenista Missionário
CPT – Comissão Pastoral da Terra
CONTAG – Confederação Nacional de Trabalhadores na Agricultura
FETRAF – Federação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura Familiar
MAB – Movimento dos Atingidos por Barragens
MCP – Movimento Camponês Popular
MMC – Movimento de Mulheres Camponesas
MPA – Movimento dos Pequenos Agricultores
MST – Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra
Via Campesina Brasil
Enviado por:  http://www.cimi.org.br/site/pt-br/?system=news&conteudo_id=6112&action=read

segunda-feira, 27 de fevereiro de 2012

José Agenor: movimento silencioso tenta desqualificar estudos sobre agrotóxicos













Agrotóxico, pimentão e suco de laranja


Por José Agenor Álvares da Silva 
Diretor da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa)
No Valor
A celeuma sobre a presença de resíduos de agrotóxicos no suco de laranja brasileiro, colocado em dúvida pelas autoridades sanitárias dos Estados Unidos, é emblemática para a discussão sobre a contaminação de alimentos por esses produtos. A presença irregular de resíduos de agrotóxicos em produtos agrícolas destinados à exportação implica em prejuízo para o agricultor brasileiro, com a devolução ou destruição do produto pelo país importador. 

O agrotóxico, por definição, é um produto aplicado para matar e a linha que separa os efeitos benéficos de eliminar uma praga e os efeitos maléficos, que podem levar um ser humano à morte, é muito tênue. Por isso, esses produtos químicos têm alvos biológicos e mecanismos de ação bem definidos. 

Só são autorizados se forem eficazes no combate a pragas específicas, sem destruir o alimento tratado, nem deixar resquícios em quantidades tóxicas para os consumidores. Isso porque os agrotóxicos estão associados ao desenvolvimento de alterações hormonais, de doenças do sistema nervoso central, de doenças respiratórias, de lesões hepáticas, de câncer e tantas outras enfermidades graves identificadas nos ensaios realizados em animais de laboratório e em culturas de células e tecidos. Tais ensaios têm constituído um excelente mecanismo para impedir possíveis agravos, prevalecendo-se das similaridades entre processos biológicos bem selecionados. 

Nos últimos quatro anos, segundo dados das próprias indústrias do setor, o Brasil assumiu o posto de maior mercado de agrotóxicos do mundo. Mesmo assim, o caminho a ser percorrido para alcançarmos os níveis de controle que os países desenvolvidos exercem sobre essas substâncias ainda é muito longo. 

Nesse cenário, a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) determina o limite máximo de resíduos de agrotóxicos em alimentos e a quantidade total de cada agrotóxico que pode ser ingerido diariamente pelas pessoas, sem que haja risco para sua saúde. São esses os parâmetros avaliados pelo tão criticado Programa de Avaliação de Resíduos de Agrotóxicos da agência. 
O programa funciona a partir da coleta de amostras de alimentos pelas vigilâncias sanitárias dos Estados e municípios em supermercados. Depois de coletados, os alimentos são encaminhados para laboratórios, onde se verifica a quantidade de resíduos de agrotóxicos em cada uma das amostras. 
Entretanto, um movimento silencioso, com a sutileza de fazer inveja ao estouro de uma manada de elefantes, tenta, cotidianamente, desqualificar os resultados do programa. A dúvida sobre a avaliação de resíduos de agrotóxicos em alimentos, que é publicada anualmente pela Anvisa, traz uma notável distorção e desinformação dos fatos, com flagrante desrespeito ao mesmo tempo à lei e à ciência. 
As atividades da Anvisa, nesse campo, têm o compromisso da transparência de seus atos em respeito à sociedade e no cumprimento de seu mandato de proteger a saúde humana com base na legislação nacional e nos conhecimentos científicos e tecnológicos mais atualizados da comunidade científica internacional. 
As referências para a conformidade dos parâmetros medidos são divulgadas em rótulos e bulas e na página na internet dos organismos registradores de agrotóxicos: Ministério da Agricultura, Instituto Brasileiro de Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) e Anvisa. São os mesmos procedimentos praticados pelos países desenvolvidos, muitos dos quais abrigam as matrizes das indústrias de agrotóxicos, que estão instaladas no Brasil. 
A segurança da qualidade dos alimentos se baseia nos conhecimentos científicos e na observação dos efeitos tóxicos, agudos e crônicos que os resíduos de agrotóxicos podem gerar nas pessoas. Se o responsável pela emissão da receita agronômica ou o próprio agricultor utilizar um agrotóxico em um alimento para o qual aquele produto não foi autorizado, o ato se qualifica como ilegal e a ingestão diária segura pode ser ultrapassada. Isso resultará em prováveis danos à saúde do próprio agricultor e do consumidor.

Os efeitos agudos dos agrotóxicos aparecem nos trabalhadores rurais que os manipulam (preparadores de calda e aplicadores) e em pessoas que vivem ou trabalham nas imediações das áreas tratadas. A literatura científica constata que as doenças crônicas ocorrem em pessoas que se expõem a pequenas doses durante um tempo prolongado, como no caso de consumidores que ingerem alimentos com pequena quantidade de agrotóxico por um longo período de tempo. 


Como agência reguladora da saúde, a Anvisa tem a obrigação de divulgar as informações sobre os riscos relativos à exposição a agrotóxicos. Essa informação é uma poderosa ferramenta de cobrança para que os atores envolvidos adotem medidas de correção dos problemas diagnosticados. 
A Anvisa não compactua com atores que, irresponsavelmente, estimulam a omissão dos dados com o intuito de desacreditar toda a cadeia envolvida na avaliação dos resíduos de agrotóxico. Não dá para a volta da velha política de o bom a gente mostra e o ruim a gente esconde. Esse tipo de omissão só favorece aqueles cuja atuação, neste campo, se caracteriza pela política do avestruz e pelo não cumprimento da legalidade, que é o princípio fundamental em um estado democrático e de direito. 
O respeito aos consumidores, em qualquer parte do mundo, é dever dos estados nacionais. Por isso, a Anvisa busca sempre aprimorar os instrumentos de avaliação dos agrotóxicos e de seus resíduos nos alimentos, para que não haja diferença entre os produtos levados à mesa do consumidor brasileiro e aqueles destinados à exportação. Os direitos do consumidor são atributos de cidadania e respeitá-los não é nenhum ato de favor ou concessão das autoridades públicas. É, isto sim, reconhecimento de uma conquista histórica da sociedade brasileira. 
*José Agenor Álvares da Silva é diretor da Agência Nacional de Vigilância 
Sanitária (Anvisa) desde 2007 e foi ministro da Saúde entre 2006 e 2007


Um pouco de humor no drama dos trangênicos

domingo, 26 de fevereiro de 2012

Ai se eu te pego, capital! [ou "pela erradicação da riqueza extrema"!]



Por aline, daniel e vinicius, gravado em Alta Floresta/MT, no dia 25 de fevereiro de 2012.

Foi feito a partir da música "Ai, se eu te pego", de Sharon Acioly e Antonio Digs (em parceria com Karine Assis Vinagre, Aline Medeiros da Fonseca e Amanda Grasiele Mesquita Teixeira da Cruz). Esta música foi interpretada por Cangaia de Jegue e Michel Teló.

Esta versão é uma paródia, criada pelas/os organizadoras/es das manifestações em Lisboa no dia 11 de fevereiro de 2012 ( "Ai, não nos calam", disponível em http://www.youtube.com/watch?v=aUfU0nf1kpw ). Nós fizemos algumas alterações na letra e incluímos um trecho da música "Comandante Che Guevara" ao final.

Segue abaixo a letra na sua versão final:
Basta, já chega, que o capital nos roube!
Ai, não nos calam
Ai não, não nos calam

Sábado, na passeata
A massa começou a gritar
E não há coisa mais linda
Que a coragem do povo a lutar

Basta, já chega, que o capital nos roube!
Ai, não nos calam
Ai não, não nos calam

Agrotóxicos e transgênicos: assim não há justiça
Ai, não nos calam
Ai não, não nos calam

Riqueza acumulada: assim não há justiça
Ai, não nos calam
Ai não, não nos calam

Economia verde: assim não há justiça
Ai, não nos calam
Ai não, não nos calam

Basta, já chega, que o capital nos roube!
Ai, não nos calam
Ai não, não nos calam

Y tu, querida presencia
Comandante Che Guevara!

Y tu, querida presencia
Comandante Che Guevara!

Viva la revolución!

País rico é país sem ricos.
Pela erradicação da riqueza extrema.

As cenas do fundo são do vídeo "World R-love-ution":http://www.youtube.com/watch?v=ctlW6vZgQuo

sábado, 25 de fevereiro de 2012

Assistência às comunidades quilombolas terá foco nas mulheres

A atenção especial às mulheres será o foco da atuação dos 65 profissionais que levarão assistência técnica rural a 4.480 famílias de 39 comunidades quilombolas na Bahia, Pernambuco, Maranhão e Minas Gerais, a partir de fevereiro. Dados do Censo 2010 do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) revelam que um em cada quatro brasileiros que vivem no campo está em situação de extrema pobreza. No Nordeste, 48,5% dessa população são mulheres.


Assistência às comunidades quilombolas terá foco nas mulheres“Historicamente, e principalmente no meio rural, as mulheres são as mais afetadas pela extrema pobreza, e as dificuldades começam com a documentação e vão até o acesso às políticas públicas”, diz Márcia Riva, coordenadora de Acesso à Terra e Cidadania do Ministério do Desenvolvimento Agrário (MDA). Ela participa esta semana, em Salvador, da capacitação para técnicos rurais que vão trabalhar com comunidades quilombolas, promovida pelo MDA e pelo Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome (MDS).

Márcia conta que, entre as mulheres em extrema pobreza do meio rural que são chefes de família, 1,6 milhão não têm rendimento próprio. O menor acesso das moradoras do campo aos recursos fica mais claro nos dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad) de 2009, também feita pelo IBGE. Ela mostra que, enquanto um homem recebe, em média, R$ 84 mensais pelo trabalho na produção agrícola, o rendimento médio delas é de apenas R$ 9 mensais.

Políticas setoriais – Nos últimos anos, o governo federal implantou uma série de políticas setoriais voltadas às mulheres do meio rural. A assistência técnica e extensão rural (Ater) com recorte de gênero, criada em 2004, já atendeu mais de 51 mil mulheres do campo, com qualificação da gestão, produção e comércio agrícola. Outro exemplo é o Programa Nacional de Agricultura Familiar (Pronaf), que já beneficiou mais de 38 mil mulheres, num total de R$ 272 milhões em créditos especiais para a produção feminina no campo.

Dentro do Brasil Sem Miséria, a meta é que pelo menos 30% dos beneficiários de Ater sejam do sexo feminino. Os projetos de fomento e organização produtiva devem levar em conta a qualificação da produção, seja na panificação, em hortas, extrativismo, artesanato, criação de pequenos animais ou na agricultura familiar. O Programa de Aquisição de Alimentos (PAA) terá ao menos 5% de sua dotação orçamentária anual direcionados para organizações compostas exclusivamente por mulheres ou com participação mínima de 70% delas.

Para Márcia Riva, tirar as mulheres rurais da invisibilidade e da situação de extrema pobreza envolve, antes de mais nada, torná-las visíveis para o Estado. “O primeiro passo, a primeira ação, é a documentação, a partir dos mutirões do Programa Nacional de Documentação da Trabalhadora Rural”, destaca. Ela afirma que em 2011, a partir do lançamento do Brasil Sem Miséria, foi possível, na Região Nordeste e no norte de Minas Gerais, emitir mais de 55 mil documentos para 20 mil mulheres. “Com o documento, essas pessoas exercem a cidadania e passam a existir para o Estado. Consequentemente, podem ser alvo de políticas setoriais”, explica.

Ater quilombola – Nas 39 comunidades quilombolas que serão visitadas pelos técnicos, a orientação é criar mecanismos para que as mulheres acompanhem o diagnóstico e a elaboração dos projetos produtivos individuais e coletivos. Esses mecanismos vão desde a criação de espaços recreativos para as crianças, que propiciem tempo livre às mães para participar das discussões, até o método de abordagem dos técnicos ao fazer as entrevistas em cada residência.

“A abordagem deve ser igual para todos os membros da família: homens, mulheres, crianças, jovens”, diz Márcia. Algumas estratégias simples, ela complementa, precisam ser observadas, como a escolha do local da entrevista, para trazer as mulheres e criar espaços onde elas se sintam ouvidas e contempladas nas demandas daquele grupo familiar. “Antes, era comum a abordagem da Ater ocorrer na roça, no galpão, onde as mulheres circulavam menos. Nessa nova lógica, é importante que o contato ocorra onde as mulheres estão, nos quintais, nas hortas ou na cozinha.”

Valéria Feitoza

80 anos do direito de voto feminino no Brasil, artigo de José Eustáquio Diniz Alves


No dia 24 de fevereiro de 2012 o Brasil comemora os 80 anos do direito de voto feminino. O direito de voto das mulheres foi assegurado pelo Decreto 21.076, de 24/02/1932, assinado por Getúlio Vargas, no Palácio do Catete, no Rio de Janeiro. Mas esta conquista não foi gratuita.

A luta pelos direitos políticos das mulheres começou ainda no século XVIII. No início da Revolução Francesa, o Marquês de Condorcet – matemático, filósofo e iluminista – foi uma das primeiras vozes a defender o direito das mulheres. Nos debates da Assembléia Nacional, em 1790, ele protestou contra os políticos que excluiam as mulheres do direito ao voto universal, dizendo o seguinte: “Ou nenhum indivíduo da espécie humana tem verdadeiros direitos, ou todos têm os mesmos; e aquele que vota contra o direito do outro, seja qual for sua religião, cor ou sexo, desde logo abjurou os seus”.
As ondas revolucionárias francesas chegaram na Inglaterra e os escritores progressistas Mary Wollstonecraft – no livro “A Vindication of the Rights of Woman” (1792) e William Godwin – no livro “An Enquiry Concerning Political Justice” (1793), também defenderam os direitos das mulheres e a construção de uma sociedade democrática, justa, próspera e livre.
Mas a luta pelo direito de voto feminino só se tranformou no movimento sufragista após os escritos de Helen Taylor e John Stuart Mill. O grande economista inglês escreveu o livro “The Subjection of Women” (1861, e publicado em 1869) onde mostra que a subjugação legal das mulheres é uma discriminação, devendo ser substituida pela igualdade total de direitos.
Com base no pensamento destes escritores pioneiros, o movimento sufragista nasceu para estender o direito de voto (sufrágio) às mulheres. Em 1893, a Nova Zelândia se tornou o primeiro país a garantir o sufrágio feminino, graças ao movimento liderado por Kate Sheppard. Outro marco neste processo foi a fundação, em 1897, da “União Nacional pelo Sufrágio Feminino” por Millicent Fawcett na Inglaterra. Após o fim da Primeira Guerrra Mundial, as mulheres conquistaram o direito de voto no Reino Unido, em 1918, e nos Estados Unidos, em 1919.
No Brasil, uma líder fundamental foi Bertha Maria Julia Lutz (1894-1976). Bertha Lutz conheceu os movimentos feministas da Europa e dos Estados Unidos nas primeiras décadas do século XX e foi uma das principais responsáveis pela organização do movimento sufragista no Brasil. Ajudou a criar, em 1919, a Liga para a Emancipação Intelectual da Mulher, que foi o embrião da Federação Brasileira pelo Progresso Feminino, criada em 1922 (centenário da Independência do Brasil). Representou o Brasil na assembléia geral da Liga das Mulheres Eleitoras, realizada nos EUA, onde foi eleita vice-presidente da Sociedade Pan-Americana. Após a Revolução de 1930 e dez anos depois da criação da Federação Brasileira pelo Progresso Feminino, o movimento sufragista conseguiu a grande vitória no dia 24/02/1932.
A primeira mulher eleita deputada federal foi Carlota Pereira de Queirós (1892-1982), que tomou posse em 1934 e participou dos trabalhos da Assembléia Nacional Constituinte. Com a implantação do Estado Novo, em novembro de 1937, houve o fechamento do Legislativo brasileiro e grande recuo das liberdades democráticas. Na retomada do processo de democratização, em 1946, nenhuma mulher foi eleita para a Câmara. Até 1982, o número de mulheres eleitas para o Legislativo brasileiro poderia se contado nos dedos da mão.
Somente com o processo de redemocratização, da Nova República, o número de mulheres começou a aumentar. Foram eleitas 26 deputadas federais em 1986, 32 em 1994, 42 em 2002 e 45 deputadas em 2006 e 2010. Mas este número representa apenas 9% dos 513 deputados da Câmara Federal. No ranking internacional da Inter-Parliamentary Union (IPU) o Brasil se encontra atualmente no 142º lugar. Em todo o continente americano, o Brasil perde na participação feminina no Parlamento para quase todos os países, empata com o Panamá e está à frente apenas do Haiti e Belize. No mundo, o Brasil perde até para países como Iraque e Afeganistão, além de estar a uma grande distância de outros países de lingua portuguesa como Angola, Moçambique e Timor Leste.
Portanto, as mulheres brasileiras conquistaram o direito de voto em 1932, mas ainda não conseguiram ser representadas adequadamente no Poder Legislativo. Até 1998 as mulheres eram minoria do eleitorado. A partir do ano 2000, passaram a ser maioria e nas últimas eleições, em 2010, já superavam os homens em 5 milhões de pessoas aptas a votar. Este superávit feminino tende a crescer nas próximas eleições. Contudo existem dúvidas sobre a possibilidade das mulheres conseguirem apoio dos partidos para disputar as eleições em igualdade de condições.
Nas eleições de 2010, a grande novidade foi a eleição da primeira mulher para a Chefia da República. Neste aspecto, o Brasil deu um grande salto na equidade de gênero, sendo uns dos 20 países do mundo que possui mulher na chefia do Poder Executivo. Com a alternância de gênero no Palácio do Planalto, o número de ministras cresceu e aumentou a presença de mulheres na presidência de empresas e órgãos públicos, como no IBGE e na Petrobrás.
Nos municípios, as mulheres são, atualmente, menos de 10% das chefias das prefeituras. Nas Câmaras Municipais as mulheres são cerca de 12% dos vereadores. Mas, em 2012, quando se comemora os 80 anos do direito de voto feminino, haverá eleicões municipais. A Lei de Cotas determina que os partidos inscrevam pelo menos 30% de candidatos de cada sexo e dê apoio financeiro e espaço no programa eleitoral gratuito para o sexo minoritário na disputa. Os estudos acadêmicos mostram que, se houver igualdade de condições na concorrência eleitoral, a desigualdade de gênero nas eleições municipais deste ano poderá ser reduzida.
As mulheres brasileiras já possuem nível de escolaridade maior do que a dos homens, possuem maior esperança de vida e são maioria da População Economicamente Ativa (PEA) com mais de 11 anos de estudo. Elas já avançaram muito em termos sociais e não merecem esperar mais 80 anos para conseguir igualdade na participação política.
José Eustáquio Diniz Alves, Colunista do Portal EcoDebate, é Doutor em demografia e professor titular do mestrado em Estudos Populacionais e Pesquisas Sociais da Escola Nacional de Ciências Estatísticas – ENCE/IBGE; Apresenta seus pontos de vista em caráter pessoal. E-mail: jed_alves@yahoo.com.br
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